Nos dias de hoje estar na, ou gostar de, política é uma condição ingrata. Não porque haja algo de particularmente penoso na actividade política que a torne mais ou menos difícil ou complexa do que por exemplo a estiva, ou o carregar de pianos, mas porque a política exige, ou deveria exigir, de quem a pratica, uma verticalidade e um sentido de justiça no limiar da ortodoxia. A política enquanto interesse pelo bem público não é uma amante fácil. Já a versão adultera da política que preza a prostituição dos valores em prol do bem individual ou privado, essa esta aberta a todos os dislates. Importa dizer que há sempre excepções para confirmar a regra e que nesta guerra em que se transformou o debate político nem tudo é pessoal ou personalizável.
Vem isto a propósito do meu post de ontem e também da crónica de hoje do colega JNAS. Por uma vez estou de acordo com ele, mas mesmo de acordo eu vou um pouco mais longe e imputo esse autismo a todo o espectro político-partidário. O que pode haver de mais autista do que acusar um partido sem olhar primeiro para o seu próprio? Pergunto eu ao João Nuno. È que agitar o libelo ao outro lado da barricada é fácil, mas perceber as suas próprias debilidades internas exige outro tipo de pega. Ver no PS um partido autista sem preceber que esse é um mal que atravessa todos os partidos do espectro político nacional é mais do que autista é desonesto e ridículo.
Este é o momento dos militantes dos partidos reflectirem sobre as suas próprias estruturas e metodologias internas de uma forma isenta e ponderada. Todos os partidos cederam a personalização da actividade partidária, até o BE. E a brilhante ideia das eleições directas, que foi apresentada como a salvação dos partidos da perversa intriga interna, rapidamente se revelou uma armadilha populista que reduz o debate à aclamação quase maoista do Líder. Foi assim com o PS, com o PSD, com o PP, etc.
Talvez fosse importante pensarmos um pouco nisto e perceber que a progressiva e cada vez mais profunda subserviência dos partidos políticos portugueses à força implacável dos seus lideres esta a dar cabo da nossa democracia. Dá muito jeito ao João Nuno vir acusar de autismo o partido da maioria, mas verdadeiro autismo é fingir que não se vê dentro de portas os mesmos tiques e façanhas de que se acusa sibilinamente o adversário. Não está o PSD/Açores rendido ao culto da sua Grande Líder? Não andou a Dra. Berta a pedir um voto de fé em nome de um putativo desgaste e fim de ciclo do PS? Não foi o último congresso do PSD/A um ritual de adoração, um baile laranja, manipulado para consumo dos crentes, sem ideias e mais nada?
Dois males não fazem um bem, meu caro João Nuno, mas ficava-te bem reconhecer que os defeitos que apontas ao teus adversários políticos são no fundo o espelho dos males que afectam também o teu próprio partido. Não o reconhecer, meu amigo, é na expressão do special one – prostituzione intellettuale.
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