segunda-feira, janeiro 9

A novela do Padre Melo

O embaraço satírico da novela do Padre Duarte Melo é mais um versículo Socialista na revelação de que a tradição já não é o que era. Não falo da tradição Católica, mas sim da moderna trindade Socialista, Republicana e Laica!

À luz deste evangelho o «saneamento» do anterior Director do Museu Carlos Machado encarna e realiza a moral que renega a existência de assentos vitalícios. Esse cânone republicano remonta à nossa I República e irmanava com outro ditame ético que determinava a absoluta separação entre os assuntos de Estado e as celestiais estrelas da Igreja. Assim, numa República, por nada ser eterno ou vitalício, o Dr.º António Manuel de Oliveira, após 20 anos de notável serviço à Cultura e à cidade de Ponta Delgada, foi naturalmente dispensado das funções de Director do Museu Carlos Machado. Motivo? Abrir alas a um surpreendente sucessor cuja revelação, anunciada antes do tempo, é uma mácula indelével no dogma Socialista da separação entre o Estado e a Igreja.

A fazer fé nas notícias publicadas neste Jornal, bem como no Diário Insular e no Correio dos Açores, urdir um labirinto de justificações e procedimentos destinados a prover um cura num lugar tão secular como o de Director de um Museu é uma «deriva» clerical que deveria ser censurada por Católicos e por Socialistas. Todavia, todo este processo que parece engendrado no segredo dos Deuses, causando a acrimónia do Padre Duarte Melo à RDP-Açores por esta ter cometido o atrevimento de revelar esta estória que era suposto ser «ultra-secreta», tem merecido um voto de silêncio indiciador do estado a que esta Região chegou.

Desde logo, é bizarra a quietude dos «agentes culturais» do costume sempre atentos e lestos na crítica implacável a quem detêm o poder e responsabilidade no domínio da Cultura. Quem não se recorda da querela recente com o Director Regional da Cultura a propósito de um relatório do Tribunal de Contas?

Por outro lado, conhecida a escassez de vigários nas nossas paróquias, com os consequentes sacrifícios dos sacerdotes que se desdobram e acumulam entre funções próprias do seu ministério, não deixa de causar assomo que se desvie um jovem e vigoroso Padre das suas funções para exercer o secular cargo de Director de um Museu ! Para o efeito, o Padre Duarte Melo, Formado em História e Teologia, para envergar o hábito de Director do Museu Carlos Machado iniciou a peregrinação pessoal e curricular que passa por uma pós graduação em Museologia. Na verdade, o hábito nunca fez o monge, pelo que, o entrosamento com as forças vivas da Cultura e do regime não se basta com a ostentação das griffes da moda passando, nomeadamente, pelo cliché de que defende a dinâmica do Museu porquanto «o conceito de museu já não é o mesmo.»!

É preciso mais. Muito mais! Desde logo foi noticiada, e nunca desmentida, a exigibilidade de um concurso ad hoc cujo figurino é talhado à medida da nova lei orgânica da Direcção Regional da Cultura, entretanto, remetida ao gabinete do Ministro da República. Claro está que o escolhido já veio a público mostrar-se «ofendido e magoado» com estes aleives que diz não possuírem qualquer sentido. Mas, à cautela, já endossou a quem de direito o seu currículo.

Por outro lado, atentos os votos clericais do profetizado Director, é manifesto que o mesmo carece de autorização do Bispo para acumular o sacerdócio com o cargo de Director de Museu. Com a habitual sapiência Portuguesa este dilema seria resolvido com astúcia salomónica possibilitando o dito Padre de rezar missa no Convento de Santo André que, como se sabe, está geminado com o Museu Carlos Machado.

O certo é que mesmo no mais triste cenário ninguém resiste e ninguém diz não a esta novela. Por um lado, os Católicos aguardam em silêncio a palavra da Sé de Angra sobre estas terrenas e vulgares notícias mas, por outro lado, não se compreende o silêncio cumplíce das hostes «culturais» do Socialismo vigente sempre prontas a reivindicarem a sua superioridade moral e cultural! Será que afinal têm medo de serem excomungadas?

João Nuno Almeida e Sousa, na Edição de 10 de Janeiro do Jornal dos Açores.
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