"A um mundo que nos é apresentado, frequentes vezes, como um duelo entre uma globalização imparável e caquécticos Estados-nação, a introdução de uma terceira personagem ajudará a tornar a peça menos monótona e previsível. Essa terceira personagem, o regionalismo, surgiu em meados do séc. XIX como resposta à periferia de certos países europeus à excessiva centralização estatal." (José Mapril, in A Globalização no Divã)Numa época em que as questões energéticas determinam muitas das opções do futuro que se quer para o planeta, esta matéria será, garantidamente, um dos maiores desafios com que os Açores vão ter de se confrontar no futuro mais próximo. Isto na medida em que dependemos sobremaneira daquilo que importamos e pelo facto de estarmos cativos dos transportes marítimos e aéreos, factor determinante e inerente à nossa mobilidade inter-ilhas e com o exterior, com implicações profundas no tecido económico insular. Não obstantes os constrangimentos intrínsecos a um território acidentado e descontinuado tem havido um claro esforço no sentido de se diminuírem os custos energéticos através do investimento no sector das energias renováveis, com um particular enfoque na ampliação e no fortalecimento da energia geotérmica, de elevado potencial. Contudo, a tecnologia ainda não nos permite a sua melhor rentabilização, sendo que parte da energia produzida não é consumida e é simplesmente desperdiçada. Este será um campo decisivo para o desenvolvimento das ilhas, com vista a garantirmos ao máximo uma maior "independência" energética e que, com isso, se permita o desvio de recursos fundamentais para áreas carenciadas.
Nessa medida, os Açores necessitam de um investimento continuado na educação/cultura, de modo a obviar às inúmeras carências sociais que ainda existem e ultrapassar o gap cultural das suas populações. Tal como no País, nos Açores vivemos a duas ou mais velocidades, quer de ilha para ilha, quer mesmo no interior da mesma ilha. Isto apesar do imperativo autonómico que nos assiste na busca incessante pelo chamado desenvolvimento harmónico, algo que em si é utópico, na simples acepção de que as idiossincrasias de cada ilha não possibilitam o crescimento idêntico para cada uma delas, ao contrário do que muitos defendem. Temos, isso sim, que melhorar os serviços inerentes a cada lugar, não esquecendo a realidade específica de cada um deles. Daí que um crescimento por igual poderá conter elementos perniciosos e induzir falsas expectativas, anulando uma diferenciação positiva que se impõe, por intermédio da introdução de práticas e modelos desajustados. Será primordial, nos anos que se avizinham, um maior empenho institucional entre governo, autarquias e privados, na coordenação e concertação de estratégias de desenvolvimento local, com vista a uma melhor rentabilização dos fundos disponíveis. O investimento futuro deverá promover a sustentabilidade ambiental e para isso é necessário o empenho de todos na concretização do equilíbrio que queremos. Mas, para alcançarmos esses objectivos, é fundamental o combate aos factores de exclusão, que atingem parte da população insular, sobretudo, com a melhoria das condições de vida e dos rendimentos. Um desafio que se impõe.
Mais que tudo, e para que tudo isto se possa um dia concretizar, é fundamental que não se confirmem as piores previsões apontadas por Al Gore na sua Verdade Inconveniente e que o Homem seja capaz de ultrapassar e de suprimir os efeitos nefastos que inflige ao Planeta, pois, a não existirem melhorias, será difícil vislumbrar um futuro risonho para toda a humanidade.
Apesar disso, ainda há quem ache que toda a deriva ecologista em torno do aquecimento global é um devaneio. Como contraponto, Al Gore cita o famoso aforismo de Mark Twain: "Não é o que não sabemos que nos cria problemas, é aquilo de que temos a certeza e que afinal não é assim". A única certeza que tenho para os próximos 20 anos é a de que os Açores não estão imunes a esta inconstância global.
* Artigo publicado na edição especial do Semanário Expresso das Nove de 18.07.08
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