domingo, julho 20

O Futuro... de graça*

Comecemos por fazer um aviso: este escrito foi elaborado com base no princípio coeteris paribus, que é como quem diz que para se poder falar dos Açores daqui a 20 anos, temos de assumir que todo o resto se manterá constante. Por “todo o resto” entendemos nada mais nada menos que o mundo e por “constante” pretendemos designar as tendências actuais e o presente ritmo evolutivo.
(Convém também que se diga que os Açores olhados por um homem de 57 anos não podem necessariamente ser o mesmo que os Açores imaginados por um homem de 37, mas quanto a isso nada há agora a fazer.)

Antes de entrarmos na matéria de facto, apenas mais uma precisão: esta será uma reflexão assumidamente utópica, não no sentido imaginário ou ficcional do conceito, mas sobretudo enquanto retrato optimista dos Açores do futuro. Julgo que ninguém levará a mal que projectemos o nosso futuro colectivo em tons de esperança, porque para pessimismos já basta a vida vivida de todos os dias.

Dito isto, imagino os Açores de 2028 como um hub euro-atlântico, em áreas tão diversas como as das ciências da terra, do mar e do clima, as novas tecnologias da comunicação e a investigação aero-espacial. Tenho consciência de que a tecnologia tem uma enorme tendência para tornar obsoleta qualquer previsão a seis meses, encurtando distâncias e o próprio tempo, mas mesmo assim assumo o risco, porque do que se trata, neste caso concreto, é de valorizar a centralidade atlântica da Região e de multiplicar as valências do respectivo potencial estratégico.
Como acontece muitas vezes, primeiro foram as preocupações de Defesa e Segurança, e os interesses a elas associados, que colocaram os Açores no planisfério geo-estratégico e os conduziram ao lugar central que hoje ocupam, enquanto ponte aérea para a projecção de forças e centro nevrálgico de monitorização do Atlântico.
O mesmo conceito exportado para outras áreas de actividade – o que se vislumbra paulatinamente, com a instalação de estações de observação científica em Santa Maria, no Pico e futuramente na Graciosa – acabará por fazer dos Açores um palco obrigatório de estudo, na climatologia, na meteorologia, nas fontes alternativas de energia, no conhecimento dos oceanos e na interligação tecnológica entre os dois lados do Atlântico, entre outras áreas do saber.

Por outro lado, julgo que os Açores, em termos da sua projecção externa, tornar-se-ão uma marca com algum grau de selectividade, assente em valores como a preservação ambiental, o desenvolvimento sustentado e a biodiversidade. A distância dos grandes centros e das grandes massas, a dimensão e o isolamento, sendo evidentes limitações à dinâmica económica de escala, tal como hoje a concebemos, tornar-se-ão, a meu ver, trunfos cada vez mais valiosos com o passar dos anos - se é que a Natureza assenta na lei da compensação, como eu penso que de facto acontece. Este posicionamento estratégico trará, necessariamente, um tipo muito específico de procura turística e de investimento externo, aprofundando a nossa relação primordial com a natureza, com o mar e com as actividades a eles ligadas.

No plano interno, e ao ritmo de crescimento e implementação de reformas que temos vivido na última década, podemos conscientemente aspirar a uma sociedade mais qualificada, base de onde se projectam outro tipo de evoluções positivas como uma maior integração social, maior coesão económica e melhores condições de segurança.

É claro que os Açores de 2028 podem vir a ser algo de muito diferente do que aqui ficou escrito. Se assim for, façam pelo menos o favor de achar que poderiam ter sido muito melhores se fossem como eu escrevi, em 2008.


André Bradford para o Expresso das Nove

* private joke (not so private, but still a joke)


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