quinta-feira, maio 15

Memória

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O dia dos Açores, e da Autonomia sob o signo do D.E.S., foi este ano vivido com a paradoxal distinção de determinadas personalidades que sempre foram mais pelo centralismo do que pela nossa Autonomia. A condecoração do General Altino de Magalhães, com a Insígnia Autonómica de Reconhecimento, foi assim um exemplar erro de casting da Assembleia Legislativa que parece ter esquecido que a personalidade em causa foi um símbolo vivo do centralismo do Terreiro do Paço que, efectivamente, passava bem sem os incómodos das Autonomias Regionais. Acresce que, esta comenda, e outras similares, distinguem um Portugal que, não só não era pelas Autonomias, como também não era partidário da Democracia como hoje a conhecemos. O Sr. Comendador Altino de Magalhães, com a cumplicidade de outras personalidades do Conselho da Revolução, foi poder entre nós não pela via legítima do voto popular mas sim por indigitação do poder revolucionário instalado pelo PREC em Lisboa. Foi o equivalente revolucionário e militarizado do Vice-Rei dos tempos coloniais. Um verdadeiro títere de uma deriva totalitária pós 25 de Abril cujo modelo das ditas “democracias populares” não era aquele que os Açorianos queriam. Com a devida ironia o Sr. General Altino de Magalhães está para a Autonomia dos Açores como o Major Otelo Saraiva de Carvalho está para a Democracia em Portugal. Fazer uso do dia dos Açores para distinguir quem por aqui passou em tais circunstâncias não deixa de ser um acto “atípico” numa cerimónia que se destina a homenagear Açorianos de alma e coração, independentemente da circunstância do seu local de nascimento. Como bem nos recorda a quadra de Maria da Graça Câmara “Pra se ser Açoriano / É preciso aqui nascer / Ou então viver a vida / Pra saber aqui morrer.” Mas há quem não tenha aqui nascido, nem aqui viveu a sua vida a favor dos Açores, mas veio aqui receber a extrema investidura de reconhecimento Autonómico quando, se algo lhes era devido, seria por conta da República ! Este episódio deixa também exposto o esquecimento, porventura premeditado, que se quer fazer dos eventos do 6 de Junho de 1975. Que daqui se retire, pelo menos, a conclusão de que a História do 6 de Junho, e do elenco das personalidades envolvidas no Verão Quente Açoriano, está ainda hoje por fazer. Aproveite-se como prólogo dessa História as pesquisas jornalísticas já efectuadas - (designadamente com destaque das peças de Nuno Costa Santos para o Açoriano Oriental, e de Carmo Rodeia para o Diário de Notícias) - e aqueles que ainda por cá andam e são capazes de dar testemunho do passado. A memória é também um bem patrimonial, a preservar e a cuidar, sob pena de extinção.
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João Nuno Almeida e Sousa nas crónicasdigitais do jornaldiario.com

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