Nas últimas semanas dois acontecimentos ao nível autárquico abalaram o clima político açoriano, já de si acicatado pelo pressentir das eleições. Em Angra do Heroísmo, José Pedro Cardoso pede a demissão alegando cansaço. Mais recentemente em Ponta Delgada, Berta Cabral, num discurso inaugural, acusa os "outros poderes" de não gostarem da sua cidade. À primeira vista estes dois acontecimentos podiam parecer totalmente desconexos, mas para quem gosta de perder tempo nesta coisa da análise política, há nestes gestos inúmeros laços de afinidade. Apesar de José Pedro Cardoso não o querer afirmar taxativamente a verdade é que desde o início do seu mandato à frente dos destinos da segunda maior, mas mais bela, das cidades açorianas, substituindo Sérgio Ávila, que transitou para a vice-presidência do Governo açoriano, que o autarca se viu a braços com inúmeros problemas financeiros. A maior ou menor dificuldade no cumprimento de um mandato governativo prende-se não só com as opções políticas, mas e principalmente com o orçamento disponível. Olhando para a demissão do autarca fica obviamente a impressão de que o que motivou a sua exaustão foi a permanente crise financeira e a falta de apoios para a resolver. Já na maior e infelizmente mais incaracterística cidade açoriana, Ponta Delgada, o problema parece ser o excesso de dinheiro e a falta de coordenação política na sua gestão. A ameaça velada de Berta Cabral na inauguração de mais um mastodonte de betão tem claramente a ver com os dinheiros que o Governo vai, ou não, investindo na cidade. Porém o mais grave disto tudo, desta demissão e deste discurso, é que ambos demonstram o quanto os políticos e governantes actualmente no activo nos Açores se perderam nas suas próprias guerras político-partidárias e se afastaram dos cidadãos. Numa região pequena e pobre como é a nossa, mas com tantos potenciais naturais e humanos, seria imperioso que os diversos níveis de governação agissem permanentemente em estreita colaboração, de forma a aproveitar os activos e diminuir os possíveis prejuízos. Infelizmente a realidade revela o oposto. Durante anos e ainda hoje os governos regionais e camarários digladiam-se em pequenas guerras de protagonismo, esbanjando investimentos, procurando benefícios pessoais ou partidários e hipotecando o futuro inteiro de um Povo e de uma região. É tempo do Povo Açoriano, independentemente da sua ideologia ou cor partidária, independentemente do lado do 6 de Junho em que nos colocamos, é tempo de assacarmos responsabilidades a quem nos governa, exigindo dos nossos eleitos que coloquem sempre o interesse dos Açores acima dos interesses da próxima eleição. A persistir esta mentalidade do quem faz mais betão ou quem dá menos dinheiro o único futuro dos Açores será o da total e irreparável descaracterização e a culpa aí não será dos políticos, mas de todo o Povo Açoriano que sucessivamente os elegeu.
publicado em Notícias - RTP Açores
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