Sejamos sinceros, isto já estava mau antes do vírus, ficou foi ainda pior.
E, a grande probabilidade é que, passada a pandemia vírica, fique pior ainda,
por força da pandemia económica. Não interessa, muito, por isso, preguiçar indolentemente
na culpabilização da coisa. Se o bicho é uma invenção chinesa ou uma criação
americana; se o confinamento salva ou se os suecos ganharam imunidade de
manada; se as vacinas virão com nano chip integrado ou se vamos voltar todos a
viver no “novo paleolítico”. Tal não significa, porém, que não se deva proceder
ao devido escrutínio político das decisões tomadas e, à consequente
responsabilização e aprendizagem. Mais do que uma vacina, talvez seja esse
aprendizado o que nos possa salvar da próxima vaga deste bicho ou da, mais que
certa, vaga de um novo bicho. Mais do que identificar o código postal do
laboratório onde o corona foi manipulado, importa sim entender que a circulação
e disseminação deste tipo de vírus se deve à maciça destruição de habitats,
levada a cabo nas últimas décadas, pelos Seres Humanos. Importa, sim,
interiorizar que a opção pelo confinamento não foi uma decisão ponderada,
tomada com base em conhecimentos tanto médicos como sociológicos, económicos e
políticos. O confinamento foi um desespero de causa, cooptado por virologistas
e governantes, em pânico com a ideia de verem os eleitores subitamente
transformados em urnas funerárias, multiplicando-se como cogumelos, em quantidades
industriais. E que, esse confinamento, foi decidido sem que os governos tivessem
qualquer esboço de plano sobre como limitar, combater e/ou contrariar os óbvios
e catastróficos efeitos do mesmo na frágil tessitura social do nosso contemporâneo
neo-liberal-capitalismo-global.
Aqui chegados, o que fazer? Pois bem, estes são os factos: o vírus existe,
tal como existirão outros, até potencialmente mais perigosos para a saúde
humana. O confinamento não é uma cura, nem sequer uma profilaxia. De que serve “salvar”
batimentos cardíacos se com isso se destroem corações? A vida é um complexo
entrelaçado de condimentos, não é apenas e só um mero registo de funções fisiológicas.
Esse é um tipo de pensamento útil apenas para bastonários e nunca para altos
dignitários. A política, aliás, serve para escutar os técnicos, mas,
acima de tudo e exactamente, para os contrariar, quando a técnica se mostra incapaz de
abranger a vasta complexidade do devir humano. O mundo, o mundo todo, está hoje
confrontado com a maior crise dos últimos cem ou duzentos anos. Para sairmos
disto, temos de recorrer ao que temos, ao que sempre tivemos, o engenho e a arte,
a criatividade e a capacidade do ser humano para, solidariamente, suplantar a adversidade,
a tirania e o caos.
Para esta crise não há soluções isoladas, ou isolacionistas. Daqui só sairemos
de mãos dadas. Inexplicavelmente, ou não, o caminho que a Europa e, por
arrasto, o País e a Região, parecem estar a seguir, por preconceito ideológico
e por pressão dos lóbis do capital, é o do endividamento. A única resposta visível
até ao momento é a do pedir dinheiro emprestado e, depois, logo se vê. É como
se os directórios europeus desejassem que, em cima da já de si brutal crise,
sobreviesse uma astronómica e gargantuana banca rota, que explodisse em cima de
nós todos como um gigantesco e psicadélico cogumelo atómico. Quando, pelo menos
a mim, parece-me perfeitamente cristalino que a única forma de ultrapassar este
momento seria (será!) imprimir euros e distribuí-los, equitativamente, por países
e por pessoas, por via de um Rendimento Básico Incondicional, pelo tempo estrito
da duração desta crise, seja ela em desenho de V, de U, de vários W ou de um doloroso e infindável L…
Mas, passemos a questões mais concretas – Açores e Turismo. O Turismo,
em toda a sua cadeia de valor, desde o pequeno agente, à grande companhia
aérea, passando pelo alojamento, a animação e a restauração, o Turismo, dizia
eu, foi a primeira vítima global do Covid-19. Uma Indústria alicerçada na
Hospitalidade não pode sobreviver num mundo de portas fechadas e de pessoas
isoladas. No entanto, é óbvio que não podem ser assacadas responsabilidades ao
Governo Regional pela debacle do sector. Mas, nas respostas à situação, sim,
podem. E, se até poderemos considerar que muitas dessas respostas estão
dependentes de soluções partilhadas com a República e entre Estados, há,
claramente, considerações que são estritamente locais. Desde logo, a manutenção
e eventual requalificação da oferta. O foco da atenção actual do Governo Regional, e dos empresários, diga-se, deveria estar totalmente empenhado na defesa e salvaguarda da
oferta, permitindo que, quando e como, a retoma se der, se se der, o Destino
Açores ainda exista como tal. Com alojamento, animação e serviços de qualidade.
Isto sim é Sustentabilidade.
O foco no emprego, não passa de uma arma eleiçoeira e uma forma de, em
género de tratos de polé, condenar as empresas ao inferno da dívida. Manter despesa,
quando não há rendimento significa défice, que leva a encargos, que levam a,
acertaram, falências. A fórmula pífia do layoff esquece todos os outros custos
que as empresas continuam, regular e impreterivelmente, a ter. Quartos para
arejar, carros para manter, luz e água, taxas, impostos, como o inefável IMI,
dividas à banca, mas, vá-la que as moratórias são das poucas coisas que até tem
corrido bem, e todo um imenso rol de pequenos custos que, ao final de cada mês, são o prego no caixão de cada infeliz empreendedor. O ponto a que esta situação
nos vai levar é a um desvario indiscriminado de falências, em que apenas se vão
salvar, os grandes, os sacrificados ou os aldrabões e sem que a Região tenha mexido
um dedo mindinho para proteger a qualidade e a diferenciação da oferta e salvaguardar
a criação de valor. O que se exigia, o que devia estar a ser veementemente exigido
pelos empresários do sector, era que o Governo tivesse já instituído um Gabinete de Crise, com a missão de, directamente no terreno, ilha a ilha, empresa a empresa, estudar
e implementar medidas de suporte básico de vida para o sector. Rendimento zero
= despesas idem. Simples! No entretanto, avaliar cuidadosamente a oferta
instalada, podando os excessos, as redundâncias e as ervas daninhas para que,
aquilo que realmente tenha potencial de crescimento possa, na verdade,
prosperar quando se der a retoma, que todos esperamos e que, inevitavelmente,
irá acontecer.
Outro dos logros em que o Governo e os empresários estão a laborar é a
questão dos mercados. Se a ideia do mercado nacional era, já de si, improvável,
ao que acresce o estar a ser estupidamente mal trabalhada. A ideia, então, do
mercado regional é de tal maneira estapafúrdia que causa dor e repulsa a insistência
com que os responsáveis regionais se utilizam dela. A números de 2019, a Região
tinha cerca de 25000 camas e registou perto de 1 milhão de hóspedes para, numa
estada média de 3 noites, pouco mais de 3 milhões de dormidas. E isto, atenção,
para uma taxa de ocupação global a rondar os 34% (!!!). Ora se tivermos em
conta que a região tem uma população de 245 mil almas e que dessas, apenas, 123
mil são população activa, ficamos com uma ideia de como o “mercado regional”
não passa de um verdadeiro gambuzino, por mais campanhas “seguramente açorianas”
que se façam. E, já nem vou sequer mencionar o facto de a Região Autónoma dos Açores
ter os piores índices de distribuição de riqueza, porque isso reduzia o mercado
regional à capacidade de um ou dois aviões da SATA.
No que toca ao mercado nacional, esse morreu em dois momentos. Primeiro,
na descontinuidade territorial e não, não estou a falar de constitucionalidade
ou inconstitucionalidade, estou a falar mesmo das perto de 900 milhas, os 1.500
quilómetros, as duas horas de avião, que separam Lisboa de Ponta Delgada. E,
aqui a ênfase deve ser posta no avião. Este ano só os muito ricos e
despreocupados, que como sabemos, em Portugal, são uma minoria, é que vão andar
de avião, os outros vão pegar no carrinho e vão de férias à terrinha. O segundo,
foi o timing. É bom lembrar que até praticamente ao início de Junho a mensagem que
os Açores andaram a passar foi a de que não queriam cá ninguém. Que a peste viajava
alojada no buço dos turistas e dos tugas do continente e que não queríamos que
viessem para cá infectar as nossas pombinhas do Espírito Santo. Tanto que, até hoje,
António Costa e Vasco Cordeiro não se falam e o continental rumina com os seus botões que aqueles açorianos são todos birutas. Ora, o que isso fez, foi com que o pai de família,
subchefe de repartição, pegasse na Maria e nos dois putos e marcasse as feriazinhas
de verão na praia fluvial de Pedrógão, para ajudar os locais, que perderam tudo
nos fogos, coitados. Açores? Não, isso é para o Marcelo e para a tia Maria
João.
Chegados aqui, com que é que ficamos? Uma mão cheia de nada. Um Presidente
do Governo, em campanha eleitoral, correndo de porta em porta, vestido de negro
e de máscara, como um médico da peste, receitando Éter aos moribundos.
Uma oposição presa nos clichés do politicamente correcto e refém dos
obscenamente altos números da abstenção. Uma associação de empresários de
turismo que está morta há muitos anos, mas que teima, qual Rasputin da
contratação pública, em não querer ver declarado o óbito. E, por fim e o pior
de tudo, uma população em que praticamente dois terços depende, directa ou
indirectamente, do Sérgio Ávila para meter comida na mesa ao fim do mês.
Como dizia no início, isto já
estava mau, o Covid, que nos meteu a nós de máscara, só veio desmascarar o quão mau isto estava…