sábado, novembro 28

da estagnação como escapatória política

 

The fault, dear Brutus, is not in our stars, but in ourselves.

William Shakespeare, Julius Caesar

Desde o dia 25 de outubro que o Partido Socialista dos Açores vive baloiçado entre um estado semi catatónico, de quem acabou de sair de um desastre rodoviário, e a denegação própria de quem se recusa a reconhecer uma realidade física, concreta e palpável. Perante este tortuoso tumulto interior o Partido, e principalmente a sua direcção, refugiaram-se no discurso da vitória moral, da usurpação do poder, da ilegitimidade parlamentar, da desconsideração institucional, dos “pecados capitais”, do “maior grupo parlamentar” e todo um outro conjunto de argumentários cujo denominador comum, por mais verdadeiros que sejam todos esses raciocínios, é a rejeição do reconhecimento que o cenário político regional mudou diametralmente desde esse dia até à realidade, que temos hoje, das direitas instaladas no poder.

Esta neurose psíquico-politica em que o Partido tem vívido, desde esse dia traumático, tem levado a, por um lado, uma estupefacção silenciosa da sua militância, remetida a uma espectativa hesitante e medrosa e, por outro, ao calculismo egocêntrico e autista da direcção do Partido, cujo distanciamento altivo e cobarde tem levado à renuncia de um prestar de contas lúcido, corajoso e transparente sobre as causas e as consequências políticas desse fatídico dia 25 de outubro.

Recorrentemente, ao longo destes dias, a pergunta mais repetida, quer nos megafones da comunicação social, quer no relativo recato das conversas entre militantes, foi sobre a continuidade, ou não, de Vasco Cordeiro na liderança do Partido. Após se ter confirmado o assumir de Vasco Cordeiro do seu mandato como deputado, eis que esta sexta-feira descobrimos o porquê da sua permanência. Vasco Cordeiro fica para poder assumir, no longínquo mês de julho de 2022, a Presidência do Comité Europeu das Regiões, cujos membros tem necessariamente que ser representantes eleitos de autoridades regionais ou locais.

Pois, a questão que agora se coloca é: quais as consequências para o Partido desta permanência? Em face do cataclismo eleitoral, Vasco Cordeiro e a sua direcção, optam pela continuidade despreocupada, quase ingénua não fora maquiavélica, ou então uma espécie de pausa, como que a pedir um time-out no jogo político, cultivando ainda uma vã esperança de que o adversário possa, por alguma razão, soçobrar a breve trecho, permitindo-se assim a sua sobrevivência institucional para, em última instância, assumir outros voos na rota Estrasburgo – Bruxelas e, também, deixar que a restante direcção possa passear a sua travessia do deserto no confortável regaço da imunidade parlamentar. Esta estagnação, este deixar como está político, fazendo de conta que os resultados eleitorais não representam uma derrota do Partido, querendo-nos fazer acreditar que não houve desgaste, exaustão e censura dos eleitores à governação do Partido, às escolhas individuais e aos desmandos pessoais e colectivos de 24 anos no poder, representa uma condenação do Partido, no médio e no longo prazo, ao cadafalso da irrelevância política. Não querer, por puro calculismo e egoísmo político fazer a devida catarse e a necessária ruptura com os resultados eleitorais e com a realidade do novo panorama político regional representa o total e completo claudicar da ideia de um Partido Socialista honrado nos seus compromissos, verdadeiro nas suas convicções e, acima de tudo, integro e desprendido, pondo sempre na frente da sua actuação política o futuro e os interesses de todos em lugar de apenas uns e dos Açores em lugar dos seus.

Ou Vasco Cordeiro compreende já a sua responsabilidade neste momento e assume-se como agente fundamental dessa ruptura, ou as bases e a militância exigem e demonstram essa verticalidade e essa coragem para cortar com o que de pernicioso existe no seu passado, ou o futuro do Partido Socialista dos Açores é a ruína e a irrelevância por muitos e bons anos, ou, pelo menos, os anos que os açorianos levarem a fartar-se, também, da governação desses que agora se vão apressar a entrincheirar nos imensos palácios do poder e da governação...

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