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De todas as lições a retirar do terramoto revolucionário com epicentro no Egipto uma delas é óbvia: ninguém é capaz de prever uma sublevação popular ou anunciar o agendamento de uma revolução.
Essa verdade deve confortar-nos e, seguramente, é também um sinal de alarme para todos aqueles que se arrastam no poder. Analistas internacionais referem como exemplo de imprevisibilidade a queda das autocracias europeias na década de setenta, ou o desmoronar em dominó, no crepúsculo da década de oitenta, dos regimes comunistas e de alguns dos seus satélites. Paradoxalmente foi nessas décadas de 70 e 80 que Moscovo patrocinou e manipulou, sob a sua influência, um modelo de integrismo islâmico que agora ameaça soçobrar.
Uma das causas do rastilho é a perpetuação no poder dos mesmos rostos e das mesmas lideranças. Sinais dessa mumificação no poder não faltam.
Só para citar os mais mediáticos Hosni Mubarak ocupa o poder desde 1981 e o coronel Muammar Qaddafi, com quem Sócrates estabeleceu parcerias económicas (!!!), está no poder desde 1969.
A queda que agora se anuncia pode surpreender mas também serve de sinal para o outro lado da fronteira, até porque 40 anos no poder no mundo árabe é muito menos tempo do que 20 anos de assentamento democrático no poder no nosso mundo.
Mas a verdade é que mesmo no anquilosado e retrógrado mundo árabe a mudança faz-se também por força das novas tecnologias. Estas tornaram impossível, por exemplo, no caso egípcio, reter a informação que tão zelosamente controlavam e monopolizavam. Essa é outra lição a retirar desta convulsão. Outra, que ninguém ainda teve integridade de o fazer, é que a condescendência europeia com esta camarilha permitiu-lhes viver no nosso quintal que agora passa a ser também um problema nosso.
Além disso previsivelmente os 22 países em ebulição, ou em vias de o serem, são todos pertencentes à liga árabe. São ditaduras que sempre contaram com a indulgência conveniente da Europa e dos Estados Unidos. Daí que outra lição fica para a história: afinal Israel tinha razão e é hoje um modelo que porventura até muitos destes manifestantes ambicionam para as suas próprias Pátrias.
Mas tal como as revoluções são imprevisíveis também estes países de matriz muçulmana o são. Recorde-se que em 1979 o Irão passou de uma monarquia progressista para uma república islâmica integrista e que, o mesmo Irão, recentemente em 2009 rechaçou na rua e com sangue uma revolta popular.
A dúvida que importa, e que deixa a Europa em suspenso, é tão só a de saber se desta revolução popular no mundo árabe se plantam as sementes para a democracia ou a serpente do mal feita à imagem e semelhança da irmandade muçulmana? Em terreno tão árido e inóspito aos direitos humanos, à tolerância, e à modernidade, creio que é tempo de começar a lavrar o terreno para a colheita que se espera. Nem que seja num oásis que venha a servir de exemplo ao deserto civilizacional e democrático que domina o mundo árabe e muçulmano.
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João Nuno Almeida e Sousa na edição de hoje do Açoriano Oriental
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