terça-feira, outubro 9

Desconhecidas entre si

Os caracteres combinados para escrever esta crónica são 1700. A distância que separa os Açores do Continente é que varia de sítio para sítio. Já encontrei 1300 km, 1500 km e 1800 km. Parabéns a quem deu nome a esta rubrica: os Açores, em 2012, continuam a ser As Ilhas Desconhecidas, de Raul Brandão, livro de 1924. Mesmo para os especialistas. Com tão pouco espaço, qual Pauleta na pequena área, vou rematar do ângulo que tenho mais ao pé. O do postal. Primeiro havia o postal. Depois os Açores no postal. Depois os Açores como postal. É urgente, penso, passar essa zona de rebentação, para usar uma metáfora de quem vive rodeado de mar e de ignorância (muitas vezes compreensível) por todos os lados. Todo o açoriano ama imoderadamente a paisagem onde vive. Mas teria razões para sentir ciúmes dela. No confronto com uma Natureza tão perfeita, qualquer habitante, mesmo o mais bonito, fica a perder. Talvez esteja aí a razão para a circunstância de os açorianos, os que residem no arquipélago, serem demasiadas vezes esquecidos. A maior parte das vezes nem no postal figuram. Muito menos os seus problemas. É fácil glorificar o Antero da literatura, difícil é conhecer o Antero que tira finos numa tasca das Capelas. Querem mais exemplos concretos, para não estar aqui só com hortênsias verbais? A RTP Açores. Há quem queira à distância desmantelá-la, sem saber que foi através dela que o micaelense pôde conhecer o rosto e a maneira de respirar e sorrir do corvino e vice-versa. E a açoriana RDP, integrada na primeira: consegue cruzar os sotaques que muito boa e cultivada gente julga resumirem-se a um. Que as ilhas sejam um mistério para fora é um problema antigo a ir resolvendo. Mas há outro. Não se transforme o arquipélago em ilhas desconhecidas entre si.

* Nuno Costa Santos (crónica publicada ontem no DN)
** O bold é meu

12 comentários:

Anónimo disse...

Caro Alexandre Pascoal
Penso que este foi o post seu que gostei mais e até vou esquecer a autoria de Nuno Santos(ele que me perdoe) para não lhe retirar pitada de interesse, pois não é à toa que muitas vezes quem traz a luz do dia tem mais valor do que o seu autor(são coisas da vida)...
As ilhas são de facto micro cosmos muito pouco dados ao convívio, à permuta e à discussão dos seus problemas...
Que isto é assim para consumo interno todos estão conscientes disso, pois muitas vezes o que faz os habitantes das ilhas debaterem em comum os seus problemas são; Ou o desporto(mormente o futebol)ou um exacerbado espírito bairrista, que discute se uma ilha é mais bela do que a outra ou se o governo fez mais despesa numa ou em outra ilha...
Para o exterior esta divisão não só se apreende como leva a que(como bem diz o texto)se fale dos Açores como coisa menos do que um Universo com pessoas e um caminho de desenvolvimento económico e social.
Será que os sucessivos governos dos Açores têm investido na defesa dos Açorianos mais do que na imagem do que o exterior tem do turismo dos Açores?
Bom Post a fazer pensar num tempo em que a preocupação politica é mais com o voto em vez de ser com o todo Açoriano, com ilhas, pessoas, problemas e necessidade de saídas para estes obstáculos.
Parabéns e saudações.
Açor

Anónimo disse...

Açor,

as ilhas são micro cosmos muito pouco dados ao convívio bla bla bla

v exa não é Açoriano, claro.

quanto ao resto, quanto aos supostamente cultos (leia-se: melros bem palrantes que dizem coisas frívolas com aquele ar petulante de (falso) cosmopolita (como se Lisboa ou Porto fossem CENTROS de alguma coisa...bem, bem, no domínio da imitação pacóvia e da sobranceira são singularmente capazes)


ou seja, caro Nuno, pouco me importa que a minha terra seja mal conhecida pelos cultivados cultos (lol)

é um favor que me fazem até. não conheçam e fiquem onde estão porque, sinceramente, prefiro ser visitado por gente inteligente, modesta e genuinamente cosmopolita do que por pavões imbecis que julgam ter o que nunca tiveram...

antes o Anthero (dos finos) do que um Marcelo Verboreia...

percebes???



Anónimo disse...

PS: ah, sim, e pedir massa a Lisboa FOI um acto completamente CONTRÁRIO ao espírito e significado do conceito da AUTONOMIA.


UMA VERGONHA é o que é: ainda não termos honrado o conceito com uma realidade!!

que Portugal não seja autónomo pouco me importa. estão habituados a isto. desde que os Ingleses ganharam aljubarota, ou até antes.

mas NÓS, que vivemos 500 anos sozinhos, sem apoio de ninguém, abandonaditos como uns cães pela Pátria Mãe....

porra!! PORRA!!!! PORRA!!

se os autonomistas fossem vivos!!

o que diriam os autonomistas destes senhores?????

Anónimo disse...

Caro anónimo
Não é liquido que o meu comentário tenha exprimido em pleno a ideia que queria transmitir(limitações pessoais, certamente...) mas penso que no essencial ficou plasmado a ideia de algumas limitações que as nossas ilhas têm, sociológica-mente consideradas, como existem em todas as regiões Portuguesas(e não só)características a corrigir, "não caem os parentes na lama" por causa disso, só quem tem sobre si, uma ideia "absoluta de perfeição" é que pode ficar ofendido com estas considerações...
Neste comentário não lhe devolvo a dúvida em ser "ilhéu", mas fico na dúvida se alguma vez pensou sobre estes assuntos.
Sem querer você desempenhou perfeitamente o papel que eu apontava como generalidade(é claro que tudo o que é geral é de diagnóstico limitado) mas de forma não mais do que uma tentativa pedagógica de corrigir alguma idiossincrasia menos positiva, que necessariamente me engloba como Açoriano...
Um Povo que não é capaz de reconhecer as suas limitações não é capaz de evoluir e eu penso e desejo o progresso cultural e social dos Açores e dos Açorianos.
Se você, a única coisa que diz sobre o meu comentário é que eu não sou Açoriano, então será (eventualmente) incapaz de observar ás realidades do nosso Povo e as sua suas especificidades em cada ilha...
Certamente que me demonstrará a sua ideia mais concreta em próximo comentário.
Saudações Açor

Anónimo disse...

Não é liquido???

Pode ser claro, inequívoco, inquestionável, ambivalente, ambiguo, pouco claro, nebuloso etc mas LIQUIDO???

Metáfora da porra, Açor.

De onde foi V Exa sacar esta expressão a la pavone??? "Não é liquido"??? Até parece o Marcelo Verboreia ou um daqueles senhores cultivados-cultos que o Nuno mencionou.

A ideia não ficou plasmada (O Sr. estudou Direito, com toda a certeza) mas eu fiquei pasmado.


"As ilhas são de facto micro cosmos muito pouco dados ao convívio, à permuta e à discussão dos seus problemas..."

O Sr já ouviu falar da Sociedade Agricola Micaelense??

Como é que pode afirmar que nas ilhas não se discutem os probs quando foi aqui que o ideal autonómico (leia Anthero) foi revitalizado???

E o liberalismo dos séculos passados???

E as tertúlias onde se discutiam as grandes questões?

E as inúmeras associações culturais que proliferavam pelas principais ilhas, mesmo durante o fascismo Salazarista?


É evidente que cada ilha foi, é, e continuará a ser um micro cosmos. Nem o asilo que dá pelo nome de RTP-A/RDP-A poderá alterar este facto elementar. A geografia terá sempre mais impacto do que a tecnologia e, nas ilhas, a geografia é mais importante do que a história. Nemésio sempre foi lido em S Miguel. Anthero sempre foi lido na Terceira. Emanuel Botelho é lido em todas as ilhas. Renata Botelho também. José Enes foi e é lido por muitos filósofos. Eu cresci a ouvir e a ler os comentários do Dr. Reis Leite, homem inteligente e perspicaz. Álvaro Monjardino é lido e ouvido atentamente por todos os Açorianos. Aristides Moreira da Motta era e ainda é lido na Terceira e noutras ilhas. (tudo isto antes da RTP-A)

A percepção dos Açores como um TODO precede a criação da RTP-A. Seria absurdo negar o seu impacto nos primeiros anos da sua existência (em que era a ÚNICA fonte de informação televisiva).

Depois de perder o monopólio cognitivo (++canais), poder-se-ia até dizer que a imensa incompetência dos senhores que administraram a RTP-a e RDP-a incentivou muitos tele espectadores a procurarem outras experiências noutros canais.(neste sentido, a RTP-a poderá até ter contribuído para o afastamento das ilhas)

O argumento de que a RTP-A foi decisiva na construção de uma consciência Açórica pode ser plausível se nos referirm

A nossa sensibilidade insular resulta de uma condição que é compartilhada por todos os ilhéus: a insularidade. O Terceirense pode fingir não gostar dos Micaelenses mas a verdade é que nos entendemos.


Anónimo disse...

errata (tou com pressa)

O argumento de que a RTP-A foi decisiva na construção de uma consciência Açórica pode ser plausível se nos referirmos apenas aos primeiros anos da sua existência quando era o único canal tely.


----


PS: errata 2: quanto aos 500 anos de "abandono".

reformulo: não foi propriamente abandono. os impostos relacionados com o pastel, a exportação de laranja, chã, trigo, milho, cevada etc etc iam para Lisboa, tal como os pagamentos pelo usufruto da base das lajes...

Contas bem feitas, nós, Açores, já contribuímos MUITO MAIS para o bolo nacional do que o contrário...

É isto que os pavones bem parlantes do cuntinente que menosprezam as ilhas ainda não perceberam...

Espero é que tenham tino na tola....só na semana passada ou-vi 2 comentadores políticos continentais (SIC-N e TVI-N) a insurgirem-se contra os devaneios financeiros dos ilhéus...

Como se as ilhas não espelhassem o todo nacional...

Como se no continente as contas públicas tivessem sido escrupulosamente administradas...

Como se o dinheiro que nos "emprestam" não lhes tivesse sido emprestado...

A verdade é que a arrogância pacóvia e ignorância de muitos continentais contribuiu mais para o sentimento de revolta insular do que qualquer ciúme entre micaelenses e terceirenses ou etc

Anónimo disse...

Desculpas pelo mau Português mas estou com muita pressa e a escrever isto num netbook com um teclado minúsculo.

Um bom dia para V Exas.



Anónimo disse...

esqueci-m de apagar isto. (tudo isto antes da RTP-A)
perdão.


Anónimo disse...

Caro anónimo
Em primeiro lugar as minhas desculpas por escrever à pressa e sem rascunhos o que poderá levar a que se sinta ofendido por utilização de termos menos apropriados, mas sou assim, e é assim que gosto de comentar, assumindo as minhas insuficiências menos literárias.
Verifico que tem tendência para adivinho 1º.era que não era açoriano, agora é que estudei direito, melhor seria que me disse-se os números do euro milhões...
Não entendeu, ou não me fiz entender sobre a falta de discussão dos problemas dos Açores pelos Açorianos, não era o facto de cada ilha não discutir os seus problemas, ou de não ler os autores das outras ilhas, nem tão pouco a falta de associativismo(relativamente maior no fascismo que em democracia)a questão era outra e prende-se com uma certa defesa e união em torno de cada ilha em desfavor do contexto dos Açores como um todo cultural, geográfico e politico...
A visão de unidade ganha-se mais enquanto emigrante, quando se tem uma visão de conjunto das nove ilhas dos Açores.
O bairrismo e uma certa disputa entre habitantes de ilhas diferentes, não se manifestam unicamente entre Micalenses e Terceirenses, como sabe...
A questão da união entre Açorianos é mais notória em torno dos habitantes de cada ilha, o que é normal até pelo afastamento geográfico e de alguma reivindicação em relação a gestão do Governo Regional...
È claro que não temos problemas graves de separação entre ilhas, não estamos propriamente perante uma situação do "Kosovo"...
No fundo o que quero afirmar(apesar do excelente momento que foi o 15 de Setembro, também nos Açores)é que há um défice de participação cívica,(o que até se prende com a actividade económica ou falta dela) nos Açores como existe em Portugal.(esta realidade é só uma insuficiência a melhorar)
Nada do que disse apaga a realidade da existência de associações(sobretudo culturais e desportivas)nos Açores, e de considerar que estas eram(relativamente) mais fortes e vivas, antes de Abril de 1974, é um fenómeno que aconteceu em todo o Portugal, por um certo desencantamento e de conversão a uma sociedade de consumo...
Não existe no Povo Português(se quiser não Açoriano)qualquer antipatia com o Açoriano, antes pelo contrário, o que existe é uma tentativa(sobretudo agora)de dividir para reinar, por parte, das entidades públicas e esta politica curiosamente, também é exercida par parte das entidades publicas Açorianas(talvez ainda de forma incipiente)devo dizer que infelizmente os governos açorianos de pouco se distinguiram dos de Portugal, na gestão da coisa pública e por isso grande parte do descontentamento com a gestão politica, se pode apontar aos governos autonómicos da Madeira e Açores...
A causa da defesa dos Açores(ou mesmo da independência) não passa por hostilizar os Portugueses(pelo menos na pessoa do seu Povo), nem penso que o elo principal da resolução dos nossos problemas passe por unicamente por Portugal, mas sim pelo Binómio(troika,Comunidade europeia e Portugal).
Quase todos os problemas de relacionamento entre Portugal e os Açores, têm a ver com falta de estima e ineficácia dos governos Açorianos em lutarem pelos seus direitos, até porque(salvo honrosas excepções)os políticos Açorianos têm um pé nos Açores e outro em Lisboa.
Já lhe disse e reafirmo, que a minha chamada de atenção(e não quero parecer importante)é para os Açores repensarem o seu papel e por isso já adiantei várias vezes a necessidade de por a sociedade Açoriana a pensar(as escolas,a economia, a cultura e a politica, mesmo as religiões,etc)sobre a história, o presente e o futuro dos Açores na forma de organização, politica, económica e social...
Enfim como disse, reconhecer as nossas insuficiências, próprias ou induzidas,é um excelente meio para iniciar um processo de progresso económico e social sustentado.
saudações, Açor

Anónimo disse...

Caro Açor

depois de comentar, lembrei-me desta experiência de emigrante que V Exa menciona. Foi nos países para onde os nossos emigrantes partiram em busca de uma vida melhor que vi os ilhéus a compartilharem a sua Açorianidade (Espirito Santo etc)

A SATA tb mt contribuiu para a aprox entre as ilhas.

A Uni dos Açores e a RTP-a tb, claro.

A Maré de Agosto tb etc

Açor, fala-se muito em bairrismo mas eu nunca me deparei com este prob quando visito a bela ilha Terceira ou outra qualquer.

Sou contra bairrismos, nacionalismos, independentismos etc e outras formas de narcisismo político.




Anónimo disse...

Caro anónimo
É exactamente este posicionamento em que me coloquei ao comentar esta temática, penso que colocou os pontos nos i,i,i, nesta questão...
Também eu sou totalmente contra esta ideia de bairrismo, mas reconheço que na minha infância também fui aguçado por ele(embora de forma tolerante)pois passava as minhas férias na minha saudosa tia na Terceira...
Ao contrário do que se deu conta, eu ainda hoje encontro este espírito bairrista na Terceira(mas também em S. Miguel)...
É de facto em realizações que têm um âmbito Açoriano, como as que falou e também(ou mais ainda)a semana do Mar e a semana dos Baleeiros que trouxeram este espírito...
Estamos agora em sintonia...
Saudações
Açor

Nuno Costa Santos disse...

Meu caro,

os intelectuais cultos só se tornam irrelevantes para o arquipélago se não tomarem decisões sobre os Açores. Aí começam a importar.

Sobre a RTP-Açores: algumas questões interessantes nesta troca de ideias. O que acho é que continua a ser uma plataforma que pode unir os açorianos (não é o facto de cometer erros de direcção e programação que deixa de ter importância).

Acho que ainda se pode aprofundar a ligação entre as ilhas. E, sim, sinto-me em casa em qualquer parte dos Açores.

Um abraço!
Nuno