sábado, outubro 20

Uma alternante visão estrábica



Por considerar mais importante concentrarmo-nos nas questões de princípio e nas ideologias que as suportam - bem ou mal, pouco importa, desde que se atenda sempre à necessária relativização -, nada (ou quase nada) do que escrevo se refere a esta ou aquela pessoa, apesar de, muitas vezes, considerar que determinadas pessoas enviesam tudo (ou quase tudo) o que merece a nossa atenção e vale ser discutido.

Ser republicano (se percebo bem o que é sê-lo e viver segundo o seu código genético), é reconhecer neste modelo político que vigora em Portugal a capacidade que todos os elementos desta Nação têm de conduzir os seus destinos e, ao mesmo tempo, é reconhecer a possibilidade que é dada aos seus cidadãos de poderem procurar pôr em prática os seus projectos, em prol de uma Nação melhor e de um Estado mais equilibrado.

Não pretendo ser o autor de mais uma análise sobre o resultado das últimas eleições legislativas regionais nem, tão-pouco, quero pedir a cabeça de alguém, qual bode expiatório. Quero, tão-somente, partilhar esta visão – porventura estrábica –, com quem tiver a paciência de ler este desabafo, de que a falta de alternância no exercício da governação é um problema muito maior para as pessoas (nas quais se constitui a Nação) do que para o sistema político em vigor que, com todas as vicissitudes daqueles que gravitam em seu redor e sabem - melhor do que ninguém - tirar partido dele, perde todo e qualquer vigor, deixando de cumprir as suas funções mais elementares.

Indubitavelmente, são as pessoas mais dinâmicas e mais criativas, com sentido crítico mais apurado e com a visão da multiplicidade de caminhos possíveis que, fora da esfera dos protegidos pelo sistema, mais sofrem com o status quo instalado, que todas as fracas e ambíguas figuras desejam ver perpetuado nos meandros políticos.

Indiscutivelmente, são muitos ainda os que, com pensamento estruturado, sofrem ao procurar contrariar as precedências no dito sistema, não conseguindo anular o facilitismo popularucho da máquina esquizofrénica do poder que se alimenta do egocentrismo do individuo que se borrifa para a coisa pública.

Hipoteticamente, a hegemonia político-partidária pode ser um enorme problema para as sociedades, na medida em que as vai amputando dos membros que as podem fazer locomover-se em direcção aos patamares onde as vantagens não servem só para serem distribuídas por aqueles mais próximos do eixo.

Hipoteticamente (mas só hipoteticamente), quanto mais hegemonia, menos novos projectos. Quanto mais hegemonia, menos riqueza social (cinjamo-nos ao valor intrínseco do Ser Humano). Quanto mais hegemonia, muito menos criatividade e muito menos horizontes a serem vislumbrados. Mas, e no entanto, quanto mais hegemonia, mais estabilidade económica (apelidada de absolutamente necessária para o nosso desenvolvimento económico).

É preciso não ignorar que as massas - de toda e qualquer sociedade - precisam do seu tempo para respirar. Tempo que não é indiferente aos ciclos políticos.

Há desafios grandes na nossa região?
Haja também igual vontade e determinação!



7 comentários:

Anónimo disse...

Caro Carlos Rodrigues
Caro Carlos Rodrigues
O seu post é elaborado, e no essencial(quero ser positivo)é um incentivo à participação das pessoas na sociedade....
A democracia existente é não só limitada como "castradora" da participação cívica...
Muita gente ficará ofendida se apontarmos como existindo um défice democrático na sociedade, mas a verdade, é que se formalmente ele não existe, a verdade é que na prática, o exercício da democracia está limitado, desde logo, tacitamente existe uma aceitação dum bi- Partidarismo com toda a sorte de facilidades aos Partidos PSD/PS em prejuízo dos putativos outros partidos candidatos...
Não só nos períodos entre eleições, onde a comunicação social faz a divulgação daqueles partidos e salienta aqueles, como sendo também verdade, que a própria consciência de moda e aceitação social(e na sociedade fechada dos Açores o controle "opressivo" e critico de proximidade) não dinamiza as massas a procurarem alternativas...
Como dizia para além desta procura da comunicação social mais ou menos aceitável, dos partidos do arco da governação, nos períodos extra eleitorais, há uma aceitação de afastar dos debates eleitorais os partidos mais periféricos ao Poder, com actos estes sim completamente discriminatórios e ilegais.
Outra leitura do texto que não aceito é que a sucessão eleitoral devia proceder-se automaticamente entre os partidos do arco da governação, independentemente da vontade(mesmo que formatada)dos eleitores.
A sucessão em democracia é também um valor autónomo ao mérito dos eleitos e à vontade dos eleitores.
No caso vertente do governo Regional era conhecido o desgaste eleitoral do PS e os erros duma politica do Betão e da obra pública (discutível) de um e de outro partido...
Se somarmos a isto a desconfiança legitima(atendendo à gestão da Câmara por Berta Cabral)a apresentação de outro candidato pelo PS e pelo desgaste maior de Passos Coelho e a não demarcação do PSD regional ao Governo Nacional, temos uma afirmação cautelosa do Povo do principio de "para pior já basta assim"...
Julgo que é este cocktail sem esquecer os erros próprios da candidatura de Berta e uma certa surpresa de Cordeiro, aliado a uma tendência conservadora do eleitorado deu a Vitória "um pouco contra ciclo" do PS...
As respostas da atitude do Povo Açoriano, vão ficar para o futuro próximo, quando a situação de crise endógena e também, resultante do desgoverno de Passos,Portas, Borges e Gaspar, surgir como tsunami, exigindo respostas.
Saudações, Açor

José Couto disse...

Gostei muito do que li. Uma reflexão necessária e muito além do imediato que aqui deixei há uns dias. Sinceros Parabéns!

Carlos Rodrigues disse...

Caro Açor,
Espero que o post, para além de elaborado, possa ser também simples de entender pelos leitores, pois, o mesmo contém algumas mensagens relativamente importantes e para lados diametralmente opostos, arrisco dizer.

Caro José Couto,
Agradeço as suas palavras.
Como reflexão, pode ser menos imediata mas, não passa de outro desabafo, apenas.

Abraço a ambos.


Lisa Garcia disse...

Carlos, vou no esteio, eu sei, mas só agora tive oportunidade de ler este teu artigo. Seriamente bom. Parabéns pela reflexão e, talvez, quer parecer-me, que deves ser ainda mais parabenizado pelo desabafo. Quantas reflexões vivem em nós sem verem a luz do dia num sincero e cuidado desabafo como este teu. Este veio ver a luz do dia e iluminou.

Carlos Rodrigues disse...

Lisa,
Flechas, de lume até, para os acomodados.
É um dasabafo. Sim!
Cuidado mas, inquieto e quer estimular. Qualquer coisa que seja.
Cheers.

Anónimo disse...

Caro Carlos Rodrigues
Agradeço também a sua resposta e digo que o seu post é de facto elaborado no bom sentido e não é totalmente apreensível numa única leitura, acusado pela sua resposta, voltei a lê-lo, e se calhar captei outras mensagens que me tinham escapado na primeira leitura.
Penso que ele é importante para entender por um lado a necessidade dum certo frenesim de cidadania e o balançar deste com a estabilidade...
Infelizmente(ou talvez não,) estamos num tempo em que a estabilidade resvala para a paz podre, tal o anacronismo da prática politica a que se chegou...
Seja como for a questão está bem colocada, neste prisma e muitos mais haverá a considerar, uns parabéns mais claros após segunda leitura.
Saudações, Açor

Anónimo disse...

Este blog começa a parecer uma ilustração verbal (se tal coisa é possível) das teses e tusa do Freud.

"Cuidado mas, inquieto e quer estimular. Qualquer coisa que seja."

Slip of the tongue?

LOL