quinta-feira, outubro 7

Bandeiras

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Os herdeiros dos Buiças, republicanos e jacobinos, juntaram-se em jubilosa esperança para a missa laica do centenário. Comemorou-se o primeiro século da república sob o lustro das celebrações oficiais que não esconderam o descontentamento e a desilusão popular. Tal como os republicanos de antanho também hoje subsistem aqueles que são cúmplices na mentira de que a revolução de 5 de Outubro foi o marco fundacional da nossa Democracia. Porém, esta mentira perpetrada, por ignorância ou má-fé, não se transformará em verdade pela força da sua repetição. A dita revolução republicana foi buscar ao ressentimento do "ultimatum" de 1890 – ( daí na versão inicial da Portuguesa se ler "contra os Bretões" onde hoje constam "canhões" !) – o combustível para a génese de um regime que, por oposição ao modelo Britânico, seria anti-liberal e centrado num partido único : o republicano. Neste centenário celebrar-se o 5 de Outubro de 1910 equivale a celebrar décadas de obscurantismo, ditadura e de decadência da Pátria. A dita revolução igualitária do 5 de Outubro, engendrada por alguns oficiais e sargentos afectos ao Partido Republicano Português, fundado no limiar da crise do "ultimatum", arredou a monarquia constitucional, na qual o Rei, enquanto Chefe de Estado, era o árbitro do regime, para instituir um regime no qual o Estado era propriedade exclusiva do Partido Republicano. Que nome se dá a este regime nas aulas de cidadania dos nossos jovens ? Perpetuando a mitomania e a ignorância encartada certamente que é rotulado, por conveniência, de regime democrático. Esta mentira encerra ainda a premissa de regime de que apenas a república é sinónimo de democracia o que, paradoxalmente, se desmente com a verdade histórica da nossa república ! Efectivamente, em 1910 os republicanos instituíram uma Assembleia fundada em duvidosa legitimidade democrática. Mesmo depois da conveniente encenação de eleições, apenas com candidatos visados pelo Partido Republicano, o voto censitário restrito aos "homens livres", que excluiu mulheres e as populações rurais com o pretexto do "analfabetismo", importou uma perda da legitimação do poder dada a erosão da representatividade. Os factos históricos falam por si : sob a monarquia tinham participado nas suas penúltimas eleições cerca de 33% de eleitores ; nas últimas eleições da I república esse número caiu para metade ! Explicam esses factos entre outros a limitação "democrática" que reduziu, da monarquia para a república, o direito de voto dos 72 % para os 30 %. Neste clima de liberdade e democracia importava ainda perseguir o catolicismo, o que se fez com os mais vis ataques à liberdade religiosa. Em suma : Portugal ainda hoje está a pagar a factura do 5 de Outubro de 1910. Até nas contas públicas esse legado pesa e passa de geração em geração, mas foi na I república que se atingiram recordes de inflação, evasão fiscal, e conflitualidade laboral. Como consequência : nova intervenção militar – ( sempre os militares em 1910, 1926 e 1974 ) – que nos atirou para o Estado Novo, e o resto da história é o que se sabe. Cem anos depois celebramos o quê ? A mesma bandeira dos jacobinos da I república, dos devotos de Salazar da II república, e a dos capitães de Abril da III república que hoje se dilui numa crise de regime numa Pátria que ainda o é, apesar de ter hipotecado a sua independência a outras bandeiras.
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João Nuno Almeida e Sousa nas crónicasdigitais do jornaldiario.com

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