sábado, abril 21

Qual precursor não censurado

Por estes dias (começo a pensar que este repetido início de frase denuncia algo obscuro que me transcende), cobardia deixou de ser falha de carácter.

Aparentemente, aqueles que se coíbem de emitir uma opinião que favoreça esta ou aquela parte são, desventuradamente, apelidados de cobardes. E importa dizer que tal juízo é feito de ambos os lados do mar tempestuoso no meio do qual a nossa autonomia atlântica se encontra, corroendo – oxalá não irremediavelmente – a nossa condição de gente que não teme a adversidade à qual votados pela geografia.

Devo dizer que não invejo tais fulanos, por considerar que a amargura que sentem - por não poderem participar activamente no debate político - só deve ser comparável à profunda frustração que um pai sente ao ver o filho que “pariu” perder-se nos tortuosos caminhos da vida. E, no entanto, creio que para ajuizar melhor sobre a dita condição e avaliar os respectivos graus de alienação da realidade que, consciente ou inconscientemente, algumas pessoas se votam, seria necessário debruçarmo-nos muito seriamente sobre aquilo que o sistema instalado tem produzido e derramado sobre todos nós, alinhados ou não.

Perante estes pensamentos que me cruzam a mente inquieta, sou forçado a questionar o meu juízo sobre o famigerado alienígena que, procurando manter-se fiel aos seus princípios, cresce contra as pressões para corporizar esta ou aquela crença e se refugia na altivez da sua humildade, por contraponto com os adeptos fervorosos, quais heróis à desgarrada que, com unhas e dentes, defendem os pontos de vista dos seus idolatrados líderes, a um ritmo tão alucinante que não lhes deixa sequer perceber que alguns deles são tão enviesados, ao ponto de terem que ser imediatamente corrigidos.

Mas, afinal, onde estão os verdadeiros corajosos? Que raça é essa que, de forma cada vez mais constante, parece hibernar? Desaparecida - como o valor na oposição - ou inexistente? Desejados (muitas vezes secretamente), é neles que reside a última réstea de esperança que a sociedade – essa “bichona” de garganta dilacerada – coloca na reviravolta necessária. Encontrá-los por aí é difícil mas, encontramo-nos, a nós, afigura-se tarefa ainda mais complexa, sistematicamente desinteressante e visivelmente mais penosa.

Para pessoas responsáveis, uma opinião credível é tão difícil de formar e nas redes sociais mais pequenas já nada dizemos. Já ninguém nos ouve (com um amigo, aprendi que não se explica algo a quem teima em não querer compreender). Olhar nos olhos e estruturar uma crítica é bem mais exigente do que ter uma qualquer “diarreia cerebral” e vociferar - ao computador - um conjunto de palavras, por vezes mal articulado e mal ancorado, que se constitui na mais resoluta forma de expressão: o comentário nas redes sociais massificadas na internet.

Não sei quantos de nós temos feito perguntas ultimamente mas, acredito que as respostas não têm sido abundantes e as pessoas continuam perdidas à procura das mais variadas formas da urgente redenção, nem sempre bem-vinda. Disfarçada de crença, a calúnia coabita com o dissimulado insulto - fácil e escamoteador -, fazendo as pessoas perderem a noção do razoável e do debate verdadeiramente importante que, aparentemente, já nem a meia-dúzia de cavalheiros interessa.

Enfim, eu já estou farto de heróis. Sobretudo, daqueles que nada arriscam. E, como eu, acredito, muitos outros. Só resta perguntar: Até quando esta demissão colectiva?

1 comentário:

Anónimo disse...

Caro Carlos Rodrigues
Não sou eu que lhe vou dizer que este post não tem todo o valor duma analise sociológica ou filosófica sobre o momento social e politico que se vive, direi mais que é bem escrito e tem mensagem.
O mal direi eu é que eventualmente muito menos do que seriam necessários, irão compreender a intenção do autor e estamos num tempo que não nos podemos dar ao luxo de desperdiçar a oportunidade para chegar ao maior numero de pessoas.
Estranhava eu e dei conta destas preocupações no ilhas, que pessoas com pensamento profundo, ou se afastassem ou teimassem em colocar posts em estilo de bilhete postal turístico...
O erro que tu dás conta neste post é as pessoas teimarem numa posição bi-polar entre apoiar o PS ou o PSD, em vez de fazerem uma analise politico social abrangente sobre os Açores,Portugal e a Europa.
Caramba nós vivemos em democracia e não é necessário ser herói, para dar a nossa opinião, ou será que esta democracia é falsa e as perseguições existem?
Compreendo perfeitamente que não seja fácil remar contra esta maré de marasmo desinteresse e da critica muito perto como é em locais como os Açores em que ainda se intervêm no facto de se ir ou não à igreja.
Seja como for a intervenção nos comentários com pseudónimo poderá ser uma forma correcta de não deixar de fora uma voz necessária.
Espero que alguma das minhas palavras faça eco, os Açores agradecem.
Saudações
Açor