Depois de assistir ao programa da RTP Açores em que foi debatido o tema Ponta Delgada Capital da Cultura fiquei estarrecido com muito do que ali foi dito, mas vou ater-me à única coisa tangível que saltou – qual pipoca prematura – da programação de PDL26, um acrónimo de raiz aeronáutica que deixa para trás séculos de transporte marítimo que ainda hoje marca a condição insular.
A BEL, multinacional da indústria de lacticínios, num prestimoso gesto de mecenato cultural, vai patrocinar uma peça/instalação artística destinada a homenagear os produtores de leite. Com o devido respeito pelos homenageados, fiquei piurso com esta fuga de informação. Bem sei que a ilha de S. Miguel rivaliza com a Índia em matéria de vacas sagradas, mas a religiosidade tem limites, muito embora também tenha transpirado no debate que a religiosidade, pois claro, lá ocupa o seu espaço protocolar na programação de PDL26.
Conheço o suficiente da obra da artista a quem está comissionada a homenagem – cuja escolha saúdo, bem como ao seu agenciamento – para saber que ela não se traduzirá, por exemplo, numa peça escultórica figurativa semelhante à beterraba que se ergue nas instalações da defunta SINAGA, mas aquilo que me choca é o frete da certificação cultural feita à indústria de lacticínios, ou seja, a vénia feita aos dias de hoje como se fossem o amanhã.
É preciso esperar que a programação oficial de PDL26 seja divulgada, mas, pela amostra, dá vontade de dizer às outras oito ilhas do arquipélago que sejam capitais da contracultura.