I
- O dia de primárias no PS foi, no essencial, uma vitória para o partido. A
adesão em massa dos eleitores, a tranquilidade dos procedimentos e a
expressividade dos resultados é disto prova inequívoca. A Comissão Eleitoral
está de parabéns, tendo sido capaz de montar e acompanhar um processo complexo
e a uma escala totalmente inovadora para um partido político com a dimensão do
PS, correndo contra as adversidades que um calendário curto e a decisão
improvisada de convocar este modelo eleitoral lhe colocava.
II
– Costa teve uma vitória estrondosa e acaba por ter de agradecer à
estratégia de Seguro, por lhe ter conferido uma legitimidade além das fronteiras
do PS. Uma diferença de 70% (Costa) contra 30% (Seguro) é uma abada
eleitoral em toda a linha. Embora continue a entender que as primárias
representam uma irreversível desvalorização da militância, que ocorre à margem
dos Estatutos e com reflexos inevitáveis no esbatimento ideológico do partido,
o certo é que a estratégia de Seguro lhe saiu completamente furada e que Costa
tem hoje uma legitimidade muito mais forte do que a que resultaria de um
simples congresso extraordinário.
III
– Apesar disto, temos de reconhecer que Seguro teve uma saída limpa.
Admitiu a derrota, demitiu-se de Secretário-geral do PS, cumpriu a palavra dada
e fica apenas como militante de base. Em democracia, tão importante como ganhar
ou perder, é saber tirar as devidas consequências das derrotas e das vitórias.
A clareza política não se compadece com “desculpas” e, de facto, Seguro, depois
de ter exposto o PS da forma como expôs e durante tanto tempo, não tinha outra
saída digna. Saiu como deve de ser.
IV
– Porém, é um facto que emergem cicatrizes inquestionáveis destes últimos quatro
meses. Apesar dos resultados de Costa e da saída irrepreensível de Seguro, não
há como não reconhecer que a unidade e coesão do partido ficou tremendamente
abalada com todo este processo, a sua delonga e a forma como ambas as
candidaturas conduziram a campanha e os diversos debates televisivos. António
Costa tem um ano para refazer a unidade no PS e terá ainda de concentrar-se no
programa eleitoral, sem poder descurar-se de nenhuma.
V
- O maior derrotado da noite é o Governo de Passos Coelho e Paulo Portas.
Depois de desejarem à força toda o oponente eleitoralmente mais frágil, eis que
não só lhes sai o candidato mais forte como, ainda por cima, vem revestido de
uma prévia legitimidade extra-partidária, com expressivos resultados e com
renovada energia. É caso para dizer, de facto, como disse António Costa, "
este é o primeiro dia do fim deste Governo".
VI
- Cá pelas nossas bandas, não há dúvida que esta é também uma vitória para
Carlos César. Depois de ter sido designado mandatário nacional da campanha de
Costa nas primárias; sendo amigo e parceiro de combate desde os tempos da JS; sendo quem, no Congresso do PS-Açores, lançou pela primeira vez
o nome de Costa para a calha da liderança do PS; e com os resultados que obteve
na federação de que é presidente honorário (87%, é obra), é natural agora que
se transforme numa relevante peça no xadrez político nacional. Carlos César
deixa, assim, Vasco Cordeiro definitivamente liberto da figura tutelar.
Para Vasco esta é a derradeira oportunidade de cortar o natural cordão
umbilical que lhe une ao histórico líder do PS-Açores. Na psicanálise política,
para que as rupturas aconteçam, não basta que os protagonistas o desejem. Na
natureza como na política, as rupturas só acontecem quando o ambiente lhes é
propício. Este é o momento.