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"O povo exerce o poder político através do sufrágio universal, igual, directo, secreto e periódico, do referendo e das demais formas previstas na Constituição". Este princípio estruturante da República Portuguesa consta do artigo 10 da Lei Fundamental e é complementado com a nota do número 2 do artigo 49 afirmando que "o exercício do direito de sufrágio é pessoal e constitui um dever cívico.". Consequentemente, o voto, seja em que circunstância for, é um dever cívico e nunca um dever jurídico, pelo que, "se tenha de considerar a imposição legal do voto obrigatório como viciada de inconstitucionalidade.". Quem o afirmava, com a legitimidade qualificada de uma cátedra, era o Professor Gomes Canotilho. O Povo dá pois por assente que o direito de votar pressupõe o princípio da liberdade de voto e, claro está, da liberdade de não votar! Ensinava em tempos o ilustre Constitucionalista que "o princípio da liberdade de voto significa garantir ao eleitor um voto formado sem qualquer coacção exterior física ou psicológica. Deste princípio da liberdade de voto deriva a doutrina da ilegitimidade da imposição legal do voto obrigatório. A liberdade de voto abrange, assim, o se e o como: a liberdade de votar ou não votar e a liberdade no votar. Desta forma, qualquer que seja a fundamentação – o direito de voto como direito de liberdade, o direito de voto como direito subjectivo –, o direito de voto livre é mais extenso que a protecção do voto livre. Daí que, na falta de preceito constitucional a admitir o voto como um dever fundamental obrigatório, se tenha de considerar a imposição legal do voto obrigatório como inconstitucional". Cremos que não terá mudado de opinião como tantos outros pela conveniência das circunstâncias. Mas, como nos recorda Jaime Nogueira Pinto, "em técnica constitucional tudo é possível e tudo pode escassear numa sociedade, menos juristas, constitucionalistas e intelectuais, para justificar ou escrever as memórias justificativas das novas ordens e dos novíssimos príncipes". Consequentemente, não causa espanto que apesar do princípio da liberdade de voto, aceite como adquirido Constitucional, se advogue, em retrocesso, o voto obrigatório. A razão não é jurídica mas sim política pois, ora se defende que há "falta de sentido de responsabilidade" dos cidadãos, ora se sustenta que é estúpida a atitude daqueles que optaram pela abstenção que, como se sabe, foi também uma censura ao PS e ao regime que tem vindo a alimentar. Se aceitarmos que é estúpido que os outros decidam sobre as questões comunitárias, só porque o resultado eleitoral não agrada à classe possidente do regime, não tarda e teremos a imposição do voto obrigatório que é tão ilegítima como a imposição do sufrágio restrito, designadamente, para os cidadãos que por "estupidez" não preencham os requisitos de capacidade eleitoral. Não queremos ir por aí e regressar a um modelo de Constitucionalismo autoritário próprio da Constituição de 1933 que é, como se sabe, a única que foi votada de modo plebiscitário. Essa é a via de um modelo autocrático e de veneração ao "dux" com o consequente desprezo pelo liberalismo, bem como pelo parlamentarismo e o partidarismo. Em suma: uma deriva pelo poder musculado do chefe do governo sob a máxima: "Tudo pelo Líder, nada contra o Líder". Contribuir para esse modelo com o voto obrigatório? Não Obrigado.
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João Nuno Almeida e Sousa nas crónicasdigitais do jornaldiario.com
"O povo exerce o poder político através do sufrágio universal, igual, directo, secreto e periódico, do referendo e das demais formas previstas na Constituição". Este princípio estruturante da República Portuguesa consta do artigo 10 da Lei Fundamental e é complementado com a nota do número 2 do artigo 49 afirmando que "o exercício do direito de sufrágio é pessoal e constitui um dever cívico.". Consequentemente, o voto, seja em que circunstância for, é um dever cívico e nunca um dever jurídico, pelo que, "se tenha de considerar a imposição legal do voto obrigatório como viciada de inconstitucionalidade.". Quem o afirmava, com a legitimidade qualificada de uma cátedra, era o Professor Gomes Canotilho. O Povo dá pois por assente que o direito de votar pressupõe o princípio da liberdade de voto e, claro está, da liberdade de não votar! Ensinava em tempos o ilustre Constitucionalista que "o princípio da liberdade de voto significa garantir ao eleitor um voto formado sem qualquer coacção exterior física ou psicológica. Deste princípio da liberdade de voto deriva a doutrina da ilegitimidade da imposição legal do voto obrigatório. A liberdade de voto abrange, assim, o se e o como: a liberdade de votar ou não votar e a liberdade no votar. Desta forma, qualquer que seja a fundamentação – o direito de voto como direito de liberdade, o direito de voto como direito subjectivo –, o direito de voto livre é mais extenso que a protecção do voto livre. Daí que, na falta de preceito constitucional a admitir o voto como um dever fundamental obrigatório, se tenha de considerar a imposição legal do voto obrigatório como inconstitucional". Cremos que não terá mudado de opinião como tantos outros pela conveniência das circunstâncias. Mas, como nos recorda Jaime Nogueira Pinto, "em técnica constitucional tudo é possível e tudo pode escassear numa sociedade, menos juristas, constitucionalistas e intelectuais, para justificar ou escrever as memórias justificativas das novas ordens e dos novíssimos príncipes". Consequentemente, não causa espanto que apesar do princípio da liberdade de voto, aceite como adquirido Constitucional, se advogue, em retrocesso, o voto obrigatório. A razão não é jurídica mas sim política pois, ora se defende que há "falta de sentido de responsabilidade" dos cidadãos, ora se sustenta que é estúpida a atitude daqueles que optaram pela abstenção que, como se sabe, foi também uma censura ao PS e ao regime que tem vindo a alimentar. Se aceitarmos que é estúpido que os outros decidam sobre as questões comunitárias, só porque o resultado eleitoral não agrada à classe possidente do regime, não tarda e teremos a imposição do voto obrigatório que é tão ilegítima como a imposição do sufrágio restrito, designadamente, para os cidadãos que por "estupidez" não preencham os requisitos de capacidade eleitoral. Não queremos ir por aí e regressar a um modelo de Constitucionalismo autoritário próprio da Constituição de 1933 que é, como se sabe, a única que foi votada de modo plebiscitário. Essa é a via de um modelo autocrático e de veneração ao "dux" com o consequente desprezo pelo liberalismo, bem como pelo parlamentarismo e o partidarismo. Em suma: uma deriva pelo poder musculado do chefe do governo sob a máxima: "Tudo pelo Líder, nada contra o Líder". Contribuir para esse modelo com o voto obrigatório? Não Obrigado.
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João Nuno Almeida e Sousa nas crónicasdigitais do jornaldiario.com
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