quarta-feira, junho 3

A bordo


Leio no ar, a bordo da carreira de regresso a Ponta Delgada, um dos jornais que comprei em terra. É um daqueles "genéricos" que a SATA deixou de disponibilizar na classe económica, mas que reservou para a classe executiva, a pretexto de colocar a companhia na rota das políticas green friendly. Uma operação de cosmética e propaganda como qualquer outra que hoje invade o nosso espaço comunicacional. No papel a notícia certifica que a SATA investiu 90 milhões de €uros na remodelação da sua frota, designadamente, para responder à "agressividade" das low cost com o inevitável "aproximar das companhias tradicionais ao modelo de baixo custo". A ser verdade este desígnio da SATA trata-se de um objectivo já superado em tantos domínios partilhados com as low cost, excepto naquele traço identitário que é o ADN das low cost: o baixo custo das tarifas! No resto a aproximação ao modelo low cost é uma realidade complementada pelos serviços de rendimento mínimo da groundforce Portugal e pelo handling da TAP Portugal que, como se sabe, divide com a SATA os incómodos da linha de serviço público entre os Açores e Lisboa. Mas, o preço low cost é que tarda em chegar ao bolso dos viajantes apesar de serem injectados milhões de €uros dos contribuintes na remodelação e imagem da SATA. Dito de outro modo: temos, no céu e na terra, assegurados os serviços mínimos que um título de transporte cauciona, mas o preço low cost é uma miragem no horizonte longínquo. Numa era em que prevalece a propaganda sobre a concreta realidade ninguém se questiona se uma quota-parte do mega investimento público poderia ou não subvencionar uma tarifa low-cost! Investimento público que é aliás canalizado para apoio a outras rotas transnacionais à boleia de buscarmos o eldorado do turismo. Por sinal, a propaganda do costume publicita, levando à auto-estrada do espaço aéreo, outras rotas e, parafraseando o poeta, "ocorrem-me em revista, a baixo custo, (a partir de Junho) países: Moscovo, Varsóvia, Helsínquia, enfim o mundo!". Mas, o meu sentimento de Açoriano oriental é de indignação quando percebo que o custo de uma viagem para Moscovo é substancialmente inferior ao preço de um ticket de serviço público daqui para Lisboa. Que dirá então o sentimento de um ocidental não residente ao querer, ou precisar, de partir de Lisboa com rumo aos Açores? Tudo isto apesar desta rota ser obrigatória, ao invés do tour por destinos tão extravagantes como Moscovo que, presumo, não consta das ambições da maior parte dos viajantes com casa de partida em Portugal. Se era para subsidiar o "tourismo" ao menos que tivessem a coragem de subsidiar os viajantes nacionais, nem que fosse à imagem e semelhança do que andaram a fazer com o comércio turístico escandinavo.

João Nuno Almeida e Sousa nas crónicasdigitais do jornaldiário.com

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