quarta-feira, julho 18

Um lugar para desaparecer

Fotografia Nelson Garrido
Um "graffiti mental interplanetário". Justo Navarro, crítico no El País, usou as palavras suficientes para definir a obra de Enrique Vila-Matas quando saiu em Espanha a primeira edição de Exploradores do Abismo, faz agora cinco anos. O livro é um dos grandes exemplos da deambulação do escritor, que escolheu os Açores como metáfora do isolamento e da nostalgia.

Descobriu o mistério da ilhas com o seu amigo Antonio Tabucchi. A 26 de Março deste ano, um dia depois da morte do escritor italiano, Vila-Matas recordou-o no seu blogue El Ayudante de Vilnius, nome retirado do protagonista de Ar de Dylan. Quando Tabucchi desembarcou no Corvo, "a ilha mais remota dos Açores", um homem que tinha um moinho de vento para moer cereais perguntou-lhe: "Senhor, o que vem fazer a esta ilha?" Ao Corvo vai-se por ir, escreve Vila-Matas, que se considera capaz de adivinhar o que pensou Tabucchi naquele momento: "Que teria gostado de ser um dos portugueses que chegaram aos Açores no Século XV e encontraram um paraíso".

Elegeu os Açores para centro de um dos contos de Exploradores do Abismo, sem nunca ter esgotado o tema. Afinal, considera-se vítima do feitiço daquelas ilhas. "Ilhas do meio do Oceano Atlântico, longe de tudo. Da Europa e da América. Talvez o feitiço dos Açores consistisse nessa distância. Em todo o caso era o lugar ideal para deixar para trás o barulho mundano."

Rita Malú, a melancólica protagonista do conto Porque ela Não lho Pediu, artista de romances de parede, "narrações reais mas de recorte novelesco, contadas através de fotografias penduradas nas paredes das salas de arte e com a fotógrafa como centro dessas histórias." Rita Malú é uma imitadora secreta de Sophie Calle e persegue-a em tudo, até quase deixar de ter identidade e iniciar uma carreira como detective privada; encontrar pessoas era o que queria experimentar da vida. O primeiro cliente foi uma mulher que procurava o ex-marido, escritor famoso que encenara o seu próprio desaparecimento para deixar de lhe pagar a elevada pensão a que era obrigado. Que melhor lugar para desaparecer se não os Açores? Lembrou-se de Aleister Crowley, que em 1930 fora a Lisboa para cumprimentar Pessoa e simulara o seu desaparecimento na Boca do Inferno, "o lugar tradicional dos suicidas de Lisboa", "terrível no Inverno", e fez-se à viagem.

No dia seguinte, um voo para o Faial, a ilha em frente ao Pico. "Viu-o da varanda do seu quarto do Hotel de Santa Cruz", esse "cone vulcânico que sobressaía de repente do oceano" e que não era mais do que "uma elevada e abrupta montanha poisada sobre o mar." Era lá que se propunha encontrar o escritor, não sem antes passar pelo Café Sport, "também conhecido como Peter"s Bar, um lugar extraordinário: algo intermédio entre uma taberna e um ponto de encontro, uma agência de informações e uma estação dos correios." Café de baleeiros, os mais corajosos do mundo, segundo Herman Melville em Moby Dick. Chegou ao porto da Madalena, uma das três maiores povoações do Pico, e sentiu a solidão no taxista que a conduziu para as Lajes. "A estrada que, no sopé do vulcão, ligava Madalena às Lajes revelou-se ser um estreito caminho que corria ao longo de um molhe ou quebra-mar, com muitas curvas e lombas pronunciadas, sobre um Oceano Atlântico azulíssimo e rebelde. A estrada, que outrora estivera repleta de vinhedos e das sumptuosas casas dos patrões (agora, todas em ruínas), atravessava uma paisagem pedregosa e melancólica com raras casas, minúsculas e solitárias, em pequenas colinas varridas pelo vento."

O que sobra é mistério. É a ele que Vila-Matas se cola para não se descolar do ambiente. Sai das ilhas agarrado a ele. Transporta-o para Paris, Veneza, até regressar a Barcelona e colocar essa paisagem para sempre no papel.

* Isabel Lucas in Ípsilon/Público de 13/06/12

7 comentários:

Anónimo disse...

Caro Alexandre Pascoal
É interessante esta passagem do estilo telegráfico dos seus textos(políticos) para a prosa longa
nos textos pro literários...
Independentemente desta dicotomia aparente, pois o politico pode ser literário e o reverso também, bem como a quantidade é um conceito relativo...
No que concerne ao texto, é interessante só agora revelar este seu gosto(omisso quando o PS no governo regional) fez obras desnecessárias, onde o cimento transformou gratuitamente a paisagem e aqueles apontamentos "bucólicos" tão justamente apreciados pelos estrangeiros que nos visitam e que são quando bem enquadrados as nossas mais valias comparativas no que diz respeito á nossa oferta turística.
É por isso (que mesmo em contradição com muito do seu discurso, por acção ou omissão)que aplaudo o texto e o grito subjacente de defesa da particularidade, ecológica,antropológica, etnográficas e culturais.
Em relação a isso, como à economia e à politica em geral há que obrigar os entes públicos a produzirem mais e melhor, que mais não seja a se anteciparem na discussão destas temáticas, para que elas surgem pensadas, oportunas e eficazes.
Seja como for o texto é positivo e quebra o bilhete postal tímido e a medo.
Parabéns pelo post.
Açor

Alexandre Pascoal disse...

Açor, o texto não é meu (o autor está inscrito no final). E quem é que aqui tem 'medo'?! Deve existir algum equívoco...

Anónimo disse...

Caro Pascoal
Em primeiro lugar as minhas desculpas pela alteração da autoria do texto.
Seja como for tens o mérito de o colocares à disposição dos leitores do ilhas.
Não disse(ou quis dizer) que tinhas medo, disse sim e reafirmo que os teus post são muitas vezes formas no mínimo, contidas de dizer as coisas,..
Como sabes digo as coisas(eventualmente com erros) que me vai na alma, tanto a criticar como a aplaudir, o que é o caso, fico satisfeito também que tenhas tido o trabalho de responder.
Saudações
Açor

Anónimo disse...

Não tenho nada contra o Vila Matas

Que nosso Senhor lhe dê muita felicidade e boa saúde.

Mas, porra, "escolhe(r) os Açores como metáfora do isolamento e da nostalgia" não é propriamente coisa inédita, isto é, nunca vista (lol), sem precedentes.

Tivesse o Vila não sei das quantas usado os Açores como metáfora de um Paraíso Socialista na Mãe Terra, a cena utópica bla bla...aí eu celebraria a criatividade do gajo.

O gajo usa os Açores coomo metafora da nostalgia e do isolamento? so what? O que é q há de especial nisto????

ganda seca.

e se o Vila Matas se juntasse ao jÚlio....

quê passa? ta tudo loonie tune???

Anónimo disse...

Açor

que tal massajares as bolas do Vila Matas e do Júlio?

Anónimo disse...

oops

desculpa

enganei-me no orgão :)

que tal massajares os egos do Vila e do Julio?

Anónimo disse...

Alexandre

o melhor do texto é o "um lugar para desaparecer!!"

tou a imaginar uma campanha de pub

venha aos açores!
um lugar para desaparecer / o lugar não pode desaparecer (espero eu). mas um gajo pode desaparecer. sendo assim:

Venha aos Açores!
Um lugar onde você pode desaparecer!!

LOL

esta pub massage na Alemanha dava resultado. os gajos ficariam chocados com a cena: vá a um lugar onde você pode desaparecer na boa!! lol o bla bla resultante de tal trauma por si só garantia pub en masse.

reformulo:

Alexandre, forma uma escola de marketing politico.

trauma consulting ltd

ou

vanish ltd

BeGone Ltd.

ou intanze o emblemático:

SeeYaLatas Ltd.

Out-of-Sight!

desculpa. o vinho ta excelente.

greetings,
le vanishing