...
Se eu soubesse dançar
convidava-te para um tango,
guiava-te nos labirintos do coração.
Voaríamos sobre os campos
como num desenho animado,
seríamos uma ameaça
à estabilidade nacional.
Se eu soubesse dançar
inventava-te um deus novo,
um deus que não temesse
o conhecimento do amor,
um deus que oferecesse à carne
o esplendoroso sangue
de um vulcão vivo.
Mas há o peso a urdir
o fim que vem do céu
para a terra e na terra
se funde com a morte.
E há as folhas das árvores
sem nome, lavadas pelo frio,
que alargam os braços
à medida do tronco do tempo,
abraçam-nos, dançam com o tempo
em tanto silêncio.
Sobre a terra continua a cair todo o céu.
E no entanto a respiração do mundo
atinge-nos como um estrépito,
também nós dançamos o tango silencioso,
nossos braços transformados em ramos,
nossos dedos como folhas pesadas.
E por dentro o sangue transforma-se-nos
numa resina crua, mágica,
um segredo sem negrume
revelando-se em todas as palavras
naturalmente proferidas,
um segredo sem negrume
revelando-se no olhar,
na respiração do mundo
dentro de nós suspirada.
...
"Convite" : Henrique Manuel Bento Fialho. "A dança das feridas".
Num postal aberto à descoberta de um blog, ora alegre, ora triste, -(mas obrigatório) - ,onde se escreve e se lê sempre com prazer e ironia. Bem diferente deste :Ilhas, na versão JNAS, mas com quem partilho uma dolorosa certeza : esta terra, que se ama com devoção divina, continua a ser um poço infernal de preconceitos. Mudaram-se os tempos, mas com eles o lastro, de "soberba" e "orgulho", permanece atracado aos anos zero do novo milénio, e quem disser, ou assumir, o contrário, será, mesmo entre iguais, perpetuamente um pária sem "humanistas" que o amparem.
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