(...)Num requebro de fraqueza registou-se no facebook e fez-se "amigo" dela. Postou uma inanidade do youtube com um vídeo da classe de 80. Regressou a uma pátria sentimental de terylene e melenas oxigenadas. Retornou a uma estrada de origem, sem regresso possível, ao ritmo dos Blondie num cartucho magnético do tamanho de um tijolo.
Na era do mp3 apenas os "dinossauros" se lembravam do áudio em formato de cartucho magnético! Mas nesse cemitério de decibéis e carcaças de Citroëns, Amis e Dyanes, que agora enferrujavam na sombra de bólides teutónicos, daqueles que passam a abrir na circular, refulgia um retrovisor para um passado em kodachrome. Uma reminiscência para um cândido imaginário desses dias em que tudo estava bem arrumado. Cada necessidade tinha a sua prateleira e, numa simplicidade garrida, recolhia-se instantaneamente a dose requerida à joie de vivre. Mas, na estrada das nossas vidas, sabia que seguimos destinos divergentes e não há fio de ariadne que nos leve de volta ao tempo que ficou suspenso numa ilusão de óptica reflectida num espelho em que os imaginários Citroën Dyane, e outros ícones, cintilam sob o sol da nossa infância. Reflectia sobre isso e colocou na net um postal com um link para o vídeo que talvez a reportasse àquela matinée que recordara num Domingo pardacento e sem história. Mas ela apenas clicou "Gosto" e escreveu "LOL". Ele que não conhecia o acrónimo googlou o mesmo e obteve uma desconcertante resposta. Resolveu "skipar" a mesma e "deletar" a sua existência no facebook. Após várias tentativas falhadas, percebeu que esse era um calvário virtual e sabendo do fetiche conventual dela logo a imaginou a ter fantasias eróticas profanando o confessionário e temeu pelas suas carnes. Damn ! E não conseguia mesmo eliminar a sua id. do facebook.
Na cabine do tempo, numa mélange de desejo e nostalgia, foi transportado para a tal matinée efervescente em que lhe pagaram o bilhete para a função de "pau-de-cabeleira". O filme era viril e destilava óleos ao rugir de rpm´s acima da "red-line". Era fita máscula e embrulhada em cabedal. Untada com graxa q.b. e cromados reluzentes que reflectiam ondas da paixão, consumadas no capô da corruptela de uma mulholland drive, ou difusas no "backseat" de uma estate station wagon "Americana".
A fita era o mais "American Dream" possível, com carburantes afrodisíacos, e voluptuosos pistons em esforço máximo no limite de griparem o motor . Ironicamente, quem estava totalmente desembraiada era ela ! Nem no intervalo desgrudou do piloto que a guiava pelas estradas no limite do precipício, onde poderia se estatelar manchando o calhau negro com o sangue encarnado do vulcão que a alimentava. Como se ele fosse um boy adestrado, e ela uma dominatrice, ordenou-lhe que fosse comprar um pack de amendoins que levou a segunda parte do filme a descascar. O musical era banal mas ela, e o parceiro de ocasião, meneavam-se como se estivessem num italo-porno vintage. Ele, o boy das encomendas e ainda infante, percebeu afinal o que era o "french kissing"...apesar da bobine debitar imagens dançantes de uma América que, na verdade, nunca existiu fora do celulóide...
(Continua ?)
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