domingo, abril 26

lamento por Abril...


Não é fácil fazer um diário quando os dias são indistintos. Quando nem o sono nocturno permite separar um dia do outro. Não é fácil compreender a realidade no meio da torrente de notícias, comentários, comentadores, mensagens e posts. Dentro do confinamento somos todos ratos num laboratório, incautos, inocentes, alheios à experiência que se abate sobre nós. Olhando para trás é difícil perceber quando tudo isto começou. De dentro do isolamento não se consegue ver, com clareza, com luz, o dia, o momento exacto, em que a Liberdade nos foi retirada. Em que as rotinas do confinamento nos foram impostas, como algemas. Mas, não foi o vírus a origem de tudo isto. Não foi a doença, não foi a contaminação exponencial. Nem foi o medo, o pânico, que varreu o mundo, como uma labareda fulminante. O que nos enclausurou verdadeiramente foi a normalidade que havia. Foi a vida que tínhamos e para a qual nos querem tão fervorosamente fazer voltar. Este confinamento não começou no vírus, começou no fim das utopias. Começou na forma lenta e gradual em como a ditadura do capital tomou conta das nossas vidas. Foi nas rotinas que nos foram impostas antes deste grande fechamento. No trabalho, no ensino formatado. Na ditadura da beleza e da fama. Na ditadura do dinheiro, do lucro. Fomos nós que nos entregamos de livre vontade à voragem da Banca, dos juros, dos créditos. Na ditadura da ciência que na verdade não sabe nada. A liberdade não nos foi roubada pelo vírus, mas pelos partidos e por todas aquelas eleições em que não fomos votar. Fomos nós que deixamos os partidos saquear a Democracia. A casa da Democracia não é o Parlamento, são as ruas deste país. A Democracia não são os ditames da política partidária. A Democracia não é a vontade dos ditos representantes, principalmente quando estes se distanciam em acções dos princípios e valores da liberdade e se arrogam a si privilégios que negam ao povo. A Democracia não é dar de comer aos sem-abrigo, é tirá-los da rua e devolver-lhes a dignidade. A liberdade não é confinamento, é solidariedade. A liberdade não é isolamento, é abraço. A Democracia é o que se canta nas janelas e varandas deste país. A Liberdade é um homem só no meio da uma avenida vazia carregando ao ombro uma bandeira de Portugal encimada de cravos vermelhos.



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