segunda-feira, fevereiro 16

Judo Clube de Ponta Delgada faz 30 anos

Entre 74 e 80, entre os meus 10 e 16 anos, vivi, ao mesmo tempo que a sociedade que me rodeava, os anos mais turbulentos da minha vida.
Numa altura em que os meus frágeis alicerces tremiam perante qualquer sismo e os meus sentimentos (quase todos hormonas) ferviam subcutaneamente, que nem lava de um vulcão a nascer, dividi o meu pai com a política, com um ideal e com a história e dividi o meu avô, José Maria, com uma família de muitos e com os outros, que nasceu para ajudar, todos presos a ele como farrapos de uma vela, rasgados ao vento e precariamente agarrados àquele mastro que não deixou ninguém perder-se na tempestade. Eram estes os Homens da minha vida, de quem, para além do sangue, herdei o H maiúsculo que tento, todos os dias, não minuscularizar.
Houve, também, um outro Homem que nesta altura me marcou profundamente. Era chefe de uma casa que para mim se tornou, de certa forma também, um lar, o Judo Clube de Ponta Delgada. O Homem, o Mestre Masatoshi Ohi. Não sei o que mais me marcou, se o homem em si, se a cultura que ele representava, nunca consegui distinguir os dois. Na realidade, por debaixo daquela máscara de samurai estava um homem que eu nunca conheci. No entanto, com ele aprendi tudo o que o desporto, e a vida, têm de superior. Respeito por nós próprios, pelo adversário; pela amizade, pela rivalidade; pelo indivíduo, pela equipa; pela vitória, pela derrota; pelo corpo, pelo espírito; pelo medo, pelo respeito.
Quando na “rua” (oposto de lar) todos se dividiam, ferozmente, entre esquerda e direita, entre separatistas e portugueses, entre bons e maus, no Judo Clube de Ponta Delgada éramos todos “macacos”, por igual, a aprender a fazer judo, um misto de arte e desporto, dança e luta.
Foi assim que me tornei amigo de companheiros judocas como o arquitecto Igor França, filho de “comunistas ortodoxos” (então “inimigo público”) e Pedro Caçorino, filho de um major português “colonialista” (então “inimigo público”). Foi assim que aprendi que existia sempre uma arena aonde todos nos podíamos despir, descatalogar e nos respeitar, a todos e a cada um, como seres humanos. Foi assim que aprendi que o meu maior e mais difícil adversário está dentro de mim. Foi assim que aprendi a ser Homem.
Como é que se agradece a um homem que eu não conheço e que nem conhece a influência positiva que teve em mim?
Sinto-me honrado e humildemente agradecido, curvo a minha cabeça e,
– Domo-arigatô-gozaimasu, Ohi Sensei!

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