Como vários epidemiologistas têm dito só saberemos a real dimensão
e extensão da pandemia do Covid-19 quando esta terminar. Só aí se poderá fazer
o balanço exacto dos infectados, dos mortos, dos que escaparam ao vírus. Porém,
muito para lá da universalização da vacina e da OMS declarar o fim oficial da
pandemia, as ondas de choque sociais, económicas e políticas desta crise far-se-ão
sentir ainda, por muito tempo, como ecos de um vasto cataclismo. Se a caracterização
correcta da crise social e económica levará décadas, as crises políticas
provocadas pela “guerra” ao Covid-19, como gostam de dizer os políticos, são
já, de certa maneira, claras. Uma das principais consequências desta crise na política
europeia foi a forma como tornou evidente a incapacidade dos vários governos em
tomar decisões políticas com base em ideologias e em colocar em primeiro lugar,
não os seus, mas os interesses das comunidades. Com mais ou menos pequenas
alterações a resposta dos vários governos europeus foi ceder à pressão popular
e científica com a adopção de medidas de fascismo sanitário. Nem por um segundo
os governos hesitaram na aceitação deste caminho autoritário e a grande massa
dos cidadãos, levados pelo medo, aceitaram de livre e espontânea vontade esta
via. Perante a necessidade de medidas imediatas, não se esperaria que houvesse
lugar a referendos sobre a resposta ao Covid-19, mas seria legítimo esperar que
os diferentes governos reagissem conforme as suas diferentes colocações no
espectro político e isto, tendo em conta a resposta autoritária, é tanto mais
grave nos governos ditos socialistas. A necessária ponderação entre os valores
da saúde pública e a defesa dos direitos, liberdades e garantias era um
imperativo ético e moral, particularmente, para os governos emanados destes partidos.
Se as ciências médicas recomendavam uma resposta alicerçada maioritariamente no
distanciamento social e no confinamento o dever dos governos socialistas era
encontrar o necessário equilíbrio entre estas respostas e a defesa da liberdade
e a garantia das protecções sociais que defendessem os mais fracos e desprotegidos
dos efeitos cegos destas medidas. Aquilo a que estamos a assistir é a forma
como o súbito confinamento, seguido de um desconfinamento hesitante, estão, em
conjunto, a destruir a economia e o tecido social das nossas comunidades. Isto porque
a verdade é que esta crise não atinge todos da mesma maneira. Há, desde logo,
um fosso profundo entre sector público e sector privado. Entre ricos e pobres. Entre
população rural e urbana. Entre o interior, desertificado e envelhecido, e o
litoral. E o que se exigia a governos ditos socialistas eram respostas que
minimizassem estas diferenças, que atenuassem os efeitos devastadores do
combate à crise nos mais fracos e desprotegidos. Pelo contrário, o que assistimos
é a uma governação imediatista e mediatizada tomada apenas por respostas
impulsivas e avulsas. E, se as medidas de saúde pública são claramente autoritárias,
as medidas económicas são fundamentalmente não-sociais. É caso para citar Nanni
Moretti e, olhando para António Costa e, já agora, para Vasco Cordeiro, e pedir
encarecidamente – façam alguma coisa de esquerda.
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