quinta-feira, julho 9

Pandemia

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Ligo e perscruto nos noticiários que passam notícias do meu país. A alienação de massas cala a desgraça deste mundo e a televisão nada me diz! Assim vai a glória do mundo que se embriaga na cultura circense e popular. O absurdo e a alienação chegaram também a Portugal e aos seus canais de serviço público. Recentemente, o canal 1 da RTP colocou no top do seu alinhamento a apresentação do galáctico Ronaldo nos palcos do Real Madrid. Uma procissão de adolescentes histéricas enchia o ecrã, desejavam tocar no ídolo, arrancar-lhe uma relíquia para mais tarde idolatrarem, e tudo isto era notícia de abertura. A repórter de serviço formulava perguntas dignas do nível etário do ensino básico, e as devotas de Cristiano afirmavam para o microfone que ele era "muy guapo" ! Tudo isto não se passou num qualquer telejornal travestido de serviço noticioso, mas no canal de serviço público da RTP que é financiada com os tostões dos contribuintes, e não com os milhões dos Ronaldinhos deste mundo. Como a peça jornalística se transformou num "lençol" infindável restou-me desligar a TV fazendo votos que algum telespectador, mais militante do que eu, se queixasse ao Provedor de tal insensatez o que, em resposta, mereceria por certo uma recomendação entalada na programação nocturna. Na esperança de tomar o pulso ao Estado da Nação ainda corri outros canais mas encalhei sempre no absurdo e em intermináveis mesas redondas que perpetuavam a sua discussão. Assim foi, por exemplo, com a "corrida à Portuguesa" em que se transformou a Assembleia da República após o Ministro da Economia ter envergado um par de cornos dirigidos à oposição, e a todos nós, pois a câmara de televisão executou em directo a pega do "toiro" como o faria qualquer forcado de cara. O gesto e as suas consequências óbvias foram motivo de intermináveis debates, entre politólogos e outros "gurus" das ciências sociais, numa inanidade superior a qualquer novela da TVI. Assim vai a saúde do parlamento Nacional enquanto por cá, na nossa réplica Regional, à falta de "sorte de varas" o tema do momento passa pelo alegado uso indevido do twitter no decurso do plenário ! À escala planetária o ensandecimento também parece fazer parte de uma conspiração de estupidificação colectiva. Com efeito, depois de uma "overdose" de Michael Jackson, tivemos ainda direito a um bónus com um funeral dourado do malogrado artista. Assisti com náusea ao evento e não resisti ao vómito quando um dos "líderes" da "comunidade" a que pertencia o Rei da Pop fez do elogio fúnebre um manifesto hagiográfico do defunto que, noutras circunstâncias, seria censurado pelo tom racista que foi usado. Efectivamente, a homilia do Reverendo Al Sharpton foi sintomática do mais tenebroso fascismo afro-americano que tem passado incólume à conta da dívida interminável que a humanidade tem para com as supostas "minorias". Assim vamos nos entretendo com esta cultura de massas, que anestesia as meninges, e faz de todos nós figurantes numa Democracia de pacotilha em que nada de substancial se discute, como por exemplo, o branqueamento do relatório da comissão parlamentar de inquérito ao caso BPN, a supervisão lassa do Banco de Portugal, as ziguezagueantes performances de Constâncio e até o injustificável e escandaloso prémio de 10 milhões de Euros pagos a Cadilhe para gerir o BPN durante seis meses! Como se vê a crise não é só de "deve e haver". É bem mais funda. É de regime e parece ter a dimensão de uma pandemia.

João Nuno Almeida e Sousa nas crónicasdigitais do jornaldiario.com

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