segunda-feira, abril 23

Dia Mundial do Livro

"A biblioteca pessoal é um anacronismo. Ocupa demasiado espaço em casas cada vez mais pequenas, fica cara e nunca é realmente aproveitada tendo em conta o seu custo ou dimensão. Um livro lido, bem vistas as coisas, não está já no nosso seu espírito, sem ocupar espaço? Para quê conservá-lo, então? E por acaso não abundam, actualmente, as bibliotecas públicas, nas quais podemos encontrar não só aquilo que queremos, mas mais do que queremos? A biblioteca pessoal responde a necessidades de tempos idos: quando se vivia num castelo ou num solar, que por estarem longe do mundo obrigavam a que se tivesse o mundo à mão, encadernado; quando os livros eram raros e muitas vezes únicos e era imperioso possuir o cobiçado incunábulo; quando as ciências e as artes evoluíam com menos rapidez e o conteúdo dos livros podia manter-se válido durante várias gerações; quando a família era mais estável e sedentária, e uma biblioteca podia transmitir-se numa mesma morada e divisão e nos mesmos armários sem perigo de dispersão. Estas circunstâncias já não se verificam. E, no entanto, há loucos que querem ter todos os livros do mundo. Porque são demasiado preguiçosos para ir às bibliotecas públicas; porque acham que basta olhar para a lombada de uma colecção para pensar que já a leram; porque se tem vocação de coveiro e se gosta de estar rodeado de mortos; porque nos atrai o objecto em si, à margem do seu conteúdo, o cheiro, o tacto. Porque uma pessoa acredita, contra toda a evidência, que o livro é uma garantia de imortalidade e que formar uma biblioteca é como edificar um panteão no qual se gostaria de ter reservado o seu próprio nicho."

Julio Ramón Ribeyro, in "Prosas Apátridas"

3 comentários:

Anónimo disse...

Caro JNAS
Curioso postares um texto do escritor Peruano Julio Ramon Ribeyro,
(desaparecido em 1994) e é curioso por ser um texto de um conjunto de outros que tocam em diversos temas, este aparentemente seria aquele que não te via a postares pois coloca a questão da liberdade de ter ou não ter uma biblioteca particular em favor duma opção socializante(se quiseres )da cultura estar ao serviço de todos, segundo o veiculo das bibliotecas públicas ao serviço da cultura e do Povo.
Eu perfeitamente apoiante da ideia, penso que a existência de bibliotecas privadas não só são,um desejável e aceitável exercício da liberdade individual a bem da cultura, como neste sistema capitalista uma condição necessária para a edição de livros.
Para além do que afirmei acima, a dádiva de espólios culturais privados, a bem do enriquecimento de bibliotecas públicas é uma mais valia cultural.
Mas o mais interessante é acreditar que o JNAS, queira criar(o que seria desejável e urgente)um conjunto de prosas(chamem-se "apátridas" ou soltas)que reponham a critica politica neste desvario em que pós o governo PSD/CDS, a coisa pública e o Pais.
O Ilhas está a necessitar deste grito de alerta e de debate público, como o pão para a boca, e estou certo, que o JNAS, é capaz com a sua frontalidade de o Abrir.
Um Ilhas tão amorfo e a medo é mais cinzento que um dia de chuva em Ponta Delgada.

Saudações
Açor

Anónimo disse...

À vocês!
Ninguém me dá umas coivinhas pa eu fazê uma sopinha?

Anónimo disse...

belo texto :)