segunda-feira, agosto 1

“Amigos de Conveniência”

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"E que fama pode haver mais vergonhosa que parecer ter em maior conta o dinheiro do que os amigos?" Essa é uma interrogação clássica de um texto de Platão num diálogo com Sócrates, o verdadeiro, não o apócrifo que foi demitido de primeiro-ministro de Portugal. Esse clássico da filosofia grega, por certo actualmente sob estudo de Sócrates, agora sim o "falso", enquanto noviço estudante universitário de filosofia algures por Paris, é uma interpelação também ao futuro da União Europeia e das nossas alianças.

Com efeito, que "amigos" europeus e americanos serão esses que, afinal, prezam mais o vil metal do que a solidariedade europeia e transatlântica? Que "amigos" são esses, como Obama, que em defesa dos seus males invocam a desdita alheia afirmando com soberba que eles, os Americanos, "não são nem a Grécia nem Portugal"? No mesmo texto o verdadeiro Sócrates responderia que as pessoas sensatas hão-de compreender que as coisas se passaram, e são, como efectivamente são !


Como há que identificar um "bode expiatório", para diabolizar e distrair, agora lembraram-se das agências de rating ! Não são novidade e algumas, como a "moody’s", são centenárias!

A análise de rating é basicamente uma probabilidade de risco de insolvência do devedor ou do risco de incumprimento das suas obrigações. Logo, quando se baixa o rating de uma entidade tal significa um sinal de alerta quanto à situação financeira da mesma e uma clara orientação para os respectivos credores. Estes, por esta análise, fazem a sua própria avaliação de risco e a partir de um nível "tóxico" de rating, quando este está tão baixo que vale "lixo", colateralmente sabem que haverá uma quebra de financiamento porque já não há juro que compense o risco e, ao mesmo tempo, a remuneração de juros mais elevada é também incomportável para os devedores. Aí o sinal amarelo tinge-se de tons carregados de um alerta vermelho de bancarrota.

E a credibilidade destas agências? A questão é posta como um paradigma negro como se fosse possível tomar o todo pela parte. Com a falência de um dos maiores bancos americanos, e o descrédito do "subprime", o rating também entrou em crise porque apesar da classificação máxima de rating o banco, no caso o Lehman Brothers, faliu! Mas a taxa de falha de uma das maiores agências de rating, a já diabolizada "moody's", é inferior a 1 %! A conclusão é óbvia: são credíveis mas falíveis. Esse é um dos lados da moeda de risco que representa o capitalismo. Mas aqui, entra ainda o factor adicional de uma conduta perversa e gananciosa. Presume-se agora, com algum fundamento, que as maiores empresas de rating continuaram a conceder ratings máximos mesmo sabendo da crise imobiliária. Aqui já não tratamos de uma opinião técnica mas de uma conduta criminosa pois esse falso diagnóstico tem impacto em toda a economia e, sobretudo, na determinação dos juros exigidos pelos credores para emprestar dinheiro a qualquer entidade, ou sequer a determinação para o emprestar. Mas, nisto do capital não há "amigos" mas apenas credores e devedores e a solidariedade política termina onde se acaba o crédito.


Independentemente do rating, no caso Português, o que todos pressentimos é que o Estado, com anos de Socialismo em particular, gastou acima das suas possibilidades, hipotecou o que tinha, e assumiu compromissos para além da sua dimensão. Não é preciso um rating para se perceber que, mais cedo ou mais tarde, os "homens de fraque" nos vinham bater à porta. Neste cenário resta a esperança de que com seriedade se possa inflectir este rumo. A expectativa sobre o futuro da União é obviamente preocupante pois com estas "amizades" de conveniência o rating político da União Europeia vale muito pouco. Caberá à conformação da Economia, pela sua "mão invisível" ou pela via "reformista", reestruturar não apenas as dívidas mas também as prioridades dos Estados e dos Cidadãos. Como está, de futuro, não teremos sequer "amigos", germânicos ou outros, dispostos a emprestar "dinheiro". Optarão antes pelo opróbrio da má fama da avareza, mas salvando-se da falência por contaminação.
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João Nuno Almeida e Sousa na edição de 1 de Agosto do Açoriano Oriental

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