sexta-feira, fevereiro 2

Dizer não ao Não!

Um dos raciocínios muito usados pelos partidários do Não é o de que a pergunta do referendo é enganadora. O termo que tem sido mais utilizado é que a pergunta é capciosa. Querem com isso fazer passar a ideia de que com esta pergunta o Estado está a enganar os cidadãos. Dizem mais, que foram os do Sim que forçaram esta pergunta e que são eles que são mentirosos, ardilosos e falaciosos. Convém explicar que a pergunta foi aprovada no Parlamento e que sofreu o escrutínio e aprovação do Tribunal Constitucional. Todos sabemos que esta pergunta é perfeitamente clara e expõe com transparência o âmbito do que está em referendo. Provavelmente os militantes do não preferiam que a pergunta fosse apenas - Aborto, sim ou não? - Com isso conseguiriam manipular ainda mais, se é que é possível manipular mais ainda do que aquilo que têm feito, a opinião pública. Ora é este mesmo Não, este que se revolta contra uma suposta mentira na pergunta que não se coíbe de usar todos os meios, mesmo os mais enganadores, mesmo os mais indignos, para atingir os seus fins. No campo do Não, o denso véu de uma visão religiosa e profundamente maniqueísta do mundo impede que se olhe para os seres humanos e se veja a total dimensão do que é o Homem, em toda a sua grandeza mas também em toda a sua falibilidade. Do lado do Não a condição humana é uma fatalidade, quase uma condenação, onde o livre arbítrio é relegado para um qualquer calabouço da mente, acessível apenas depois de cumpridos todos os ditames de um qualquer Deus omnipotente e castigador. O Não, embrenhado numa exaltação caritativa, de canonização da Vida como dogma absoluto e intocável, esquece que a vida, a vida real, de todos os dias, só o é se for digna, só o é se for humana. E a Vida Humana só é digna se tiver em conta todas as imperfeições, todas as contradições do ser humano e da sociedade em geral. Que espécie de Vida é essa que não respeita a dignidade do ser humano? Que se arroga o direito de ser totalitária, dogmática? Que vida é essa que não se permite ponderar sobre a decência e a nobreza interior de cada um? O Não vive num mundo em que nos é vedado pensar sobre o nosso próprio futuro, em que nos é vedado respeitar a dignidade dos que nos são mais próximos e mais queridos. Mas o que é mais grave é que o Não, déspota, opressor, quer forçar sobre cada um e todos nós a sua visão da existência, o seu dogma, e, no mais puro e devastador dos maquiavelismos não olha a meios para conseguir o seu intento, manipulando, distorcendo, insultando, recorrendo mesmo à demagogia mais mesquinha, que usa crianças em desfiles, que distribui efígies de fetos, que escreve cartas ficcionadas de supostos embriões e as transporta aos pais na mochila de meninos e meninas de infantário. O Não, este Não, acha que a pergunta é capciosa. Eu digo que este Não é que se esqueceu de ser justo, de ser íntegro, de ser verdadeiro.

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