quarta-feira, outubro 28

A Autonomia no seu Labirinto

 

foto André Kosters/Lusa

André Ventura é muitas coisas, mas se há dom que não creio que tenha são poderes premonitórios. No entanto, foi dele a declaração que adivinhou o resultado das eleições de Domingo passado. “Um terramoto”! Se calhar mesmo, um verdadeiro abalo tectónico na tessitura político-partidária da região.

Para o PS e para Vasco Cordeiro estas eleições começaram, provavelmente, a ser perdidas em 2012. A verdade é que Vasco Cordeiro nunca conseguiu afirmar plenamente uma identidade própria dentro do projecto socialista, tanto no Governo, como no próprio partido. A herança Cesarista, que no partido nem herança foi, mas antes uma presença e um dominio constante, nunca permitiram que Vasco Cordeiro marcasse uma liderança, uma estratégia e uma personalidade própria que lhe possibilitasse autonomizar a sua governação dos 24 anos de governação socialista. Isto pode parecer incongruente, mas essa ligeira nuance, a governação e o partido de Vasco Cordeiro, teria feito, certamente, toda a diferença. O PS e a governação socialista foram sempre de Carlos Cesar e nunca de Vasco Cordeiro. Isso viu-se na longevidade de Sérgio Ávila, na omnipresença de Carlos Cesar, na incompreensível e absurda telenovela da “Casa da Autonomia” e da sua Estrutura de Missão comandada à tripa forra por Luísa Cesar e na ascensão e autoridade desenfreada de Francisco Cesar. Ao mesmo tempo, causa igual tristeza e estranheza a forma como Vasco Cordeiro foi, sucessivamente, triturando figuras com gabarito, validade intelectual e política, competência e projecção na sociedade açoriana. Desde os Governos, às listas de deputados, às empresas públicas e tantos outros cargos com maior ou menor visibilidade, a fúria autofágica de Vasco Cordeiro criou um imenso exército de descontentes e de ressentimentos. Assim de cabeça lembro-me de nomes como Fagundes Duarte, Piedade Lalanda, Luís Cabral, Nuno Domingues, Pilar Damião, João Roque Filipe, Nuno Mendes, Miguel Cymbron, António Gomes de Menezes, Fausto Brito e Abreu. E, mais recentemente, os casos de Filipe Macedo ou da limpeza nas listas de deputados, que correu, sem apelo nem agravo, com Renata Botelho, Graça Silva e Sónia Nicolau, sem que se soubesse da mais pálida justificação. Ao mesmo tempo, que uma série de outras figuras eram candidamente protegidas e apaparicadas, fossem quais fossem, e foram muitas, as asneiras, para usar um termo suave, que cometessem. De que, para mim, o caso mais dramático e paradigmático foi a dupla Vitor Fraga e Francisco Coelho. Um mistério que só possivelmente a história elucidará…

O caso das listas de deputados merece um breve comentário. Não sei porque cargas de água criou-se uma ideia de que as ditas listas, em lugar de serem feitas por pessoas competentes, sejam militantes ou independentes, têm de ser espelhos mais ou menos turvos da diversidade geográfica e socioprofissional das ilhas. Em lugar de ter um grupo coeso de políticos, as listas de deputados tornaram-se numa sopa da pedra, feita de personalidades avulsas, cuja mais valia política é a fama na junta, no clube de futebol, na agremiação e no café da freguesia ou até, como nesta última, no Youtube… o resultado final e mesmo contando os lambe-botas e os vira-casacas são grupos parlamentares de fraquíssima qualidade, como é agora o caso do futuro grupo parlamentar do PS. Embora, diga-se que, neste particular, o PSD é igual…

Se juntarmos a isto tudo a Governação errante, os dossiers polémicos, as suspeições judiciárias e, piece de resistance, a debacle da SATA, ou a malfadada Covid, tudo estava lá para pressupor que a noite de 25 seria amarga para o PS, embora, nem mesmo eu acreditasse que podia ser tão amarga. Vasco Cordeiro chega assim ao seu último mandato, se é que o vai ser, e para usar a imagem do timoneiro, que ele próprio escolheu, como um naufrago, desidratado e andrajoso, lançado sobre a areia da praia, arfando por água, sombra e cuidado. Com menos 5 deputados, sem tábua de salvação à esquerda e com a direita enraivecida e salivante, silvando como hienas, pelo sangue socialista, as hipóteses de formar um governo estável são praticamente nulas. Tirando, obviamente, a possibilidade de, humildemente, propor um entendimento ao centro. Um governo de Bloco Central, com Bolieiro a Vice-presidente, mais uma ou duas pastas para o PSD, inclusive dando-lhes a presidência da ALRAA e estendendo esse entendimento à sociedade civil, numa grande coligação autonómica para navegar essa imensa tempestade económica e social que aí vem. Se qualquer dos protagonistas ou dos partidos que estão neste momento na contenda puser, de facto, os interesses da região à frente dos do seu partido ou dos seus pessoais, era isto que devia fazer. E daqui a quatro anos, queira Deus já sem Covid, quem tiver as melhores unhas tocará sozinho a guitarra. Qualquer tentativa de governar isolado ou em coligações negativas morrerá à primeira dificuldade que, ou muito me engano, será já a breve trecho com o borregar da SATA…

Quanto à suposta maioria de direita a verdade é que ela não existe. O que há, neste novo quadro parlamentar, é uma maioria anti-PS. Sendo que, para além disso, o CHEGA não é de direita. O CHEGA é de extrema direita! E, embora seja aceitável a sua presença no parlamento, é a vontade de 5% dos eleitores, não é já, de forma alguma, admissível que os restantes partidos se aproveitem do CHEGA, legitimando com esse gesto o fascismo latente do partido do Dr. Ventura, para assaltar o poder. Por outro lado, embora muitas das suas principais figuras venham do CDS e do PSD, é um erro pensar que a Iniciativa Liberal encaixa nas visões tradicionais de esquerda e direita. Tal como, também tenha as minhas duvidas, que o PAN possa ser entendido como um partido de esquerda. A haver um entendimento das direitas, não será uma maioria, nem tão pouco uma geringonça, será antes uma coligação negativa com o único intuito de tirar o PS do poder e acabar, de uma vez por todas, com o reinado da família Cesar. Embora, neste último particular, eu até possa estar de acordo com a necessidade política desse culminar, essa não será certamente a forma correcta de o fazer e seria, proverbialmente, deitar fora a região com a água do banho…

Quem tem, neste momento, a responsabilidade de fazer as pazes com o seu passado, deixando no passado o que lá deve estar, com o que de bom e de mau as suas lideranças tiveram, é o próprio Partido Socialista. Há uma democracia interna para conquistar dentro do Partido Socialista dos Açores, e essa libertação, se não for iniciada pela liderança tem que o ser pela militância. Figuras como Cristina Calisto, Rodrigo Oliveira, ou mesmo Andreia Cardoso, são hoje esperanças para um futuro PS, que seja mais solidário, mais aberto e mais justo.

Esperemos para ver. Os próximos tempos políticos destas nove ilhas serão certamente duros, mas indubitavelmente interessantes. Viva a Democracia! E, agora mais do que nunca, Viva o PS!

6 comentários:

Anónimo disse...

Vais para o olho da rua! Acabou-se o polvo e as asneiradas deste blog parolo.

Rui Coutinho disse...

Há quem não acredite, mas também há naufrágios com águas mansas.
Um abraço

Pedro Arruda disse...

Por agora as águas podem estar mansas mas vem aí borrasca e o homem do leme já naufragou... :-)
Abraço caro Rui

Anónimo disse...

Oh Vasco o erro foi afinal não ter escolhido o Pedro para deputado!

Anónimo disse...

Dedica-te à fruta. Nos próximos 20 anos não há tacho.

Anónimo disse...

Caro Pedro Arruda.
Sem Ps ou com Psd, nada melhora se a visão da politica e da realidade continuar a ser o interesse da dança das cadeiras ou dos interesses pessoais.
AÇOR